O Governo Federal revogou, recentemente, o Decreto que concedia a uma série de comissionados o poder de decretar sigilo em documentos e dados públicos. O que parece uma vitória da sociedade no que diz respeito à informação, na verdade demonstra a fragilidade da garantia que os cidadãos têm para acessar dados e documentos sobre o seu próprio governo.
De acordo com Alexsandro Ribeiro, professor de jornalismo do Centro Universitário Internacional Uninter, o cenário geral é de uma transparência que dá um passo à frente, mas recua dois passos na sequência. “A medida colocaria em xeque uma das principais ferramentas da sociedade quando o assunto é transparência passiva”, afirmou.
Os episódios recentes que reforçam isso começaram em janeiro, com o Decreto assinado pelo vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB) promovendo alteração no texto da Lei de Acesso à Informação (de 2012). “Na prática, Mourão resolveu dar poder para mais pessoas do governo tornarem informações secretas ou ultrassecretas, inclusive uma série de comissionados, cuja nomeação apresenta, via de regra, interesse político”, afirmou Alexsandro.
Assim, se antes apenas o presidente e seu vice, ministros, comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica e pouco mais de uma dúzia de altas patentes do governo poderiam dizer que uma informação é sigilosa, com o Decreto, diretorias e presidências de empresas públicas e autarquias e mais uma centena de comissionados passariam a ter o poder na ponta da caneta para recusar acesso à informação. “A medida demonstra o compromisso da atual gestão com a transparência pública, abrindo as portas para a censura”, disse o professor.
Segundo Alexsandro, o recuo da presidência ao retirar o efeito do Decreto atende muito mais uma tentativa de evitar que sua imagem de poder ante o Congresso seja agravada. “Isso porque a Câmara aprovou projeto que derrubava a medida de ampliação do sigilo. Ou seja, foi após essa derrota que o governo decidiu dar um passo atrás, antes que o projeto fosse também aprovado pelo Senado.”
No meio desse cabo de força, a transparência pública acaba sendo apenas uma ferramenta para que a Câmara demonstre ao Executivo que ele vai ter que negociar, dialogar e até ceder para conseguir aprovar medidas no Legislativo. “E olha que a derrota no caso do Decreto foi por votação simples em único turno. Em um futuro próximo, o governo espera aprovar projetos tão polêmicos quanto o da alteração da Lei de Acesso à Informação, como Proposta de Emenda Constitucional, com dois terços da Câmara e em dois turnos”, prevê.
Deixando o jogo político de bastidores e de bancada de lado, a mensagem que se passa é que uma canetada lá e outra cá são suficientes para deixar à berlinda uma das instituições mais caras e fundamentais para a democracia e para a gestão pública. “O que agrava a situação é que afora uma repercussão midiática decorrente da visibilidade dos primeiros atos e dias de um governo, poucas manifestações sociais ou mobilizações foram notadas na prática.”
Para o professor, uma voz seria silenciada sem ao menos uma pressão por manutenção de direitos. “Não se fere a transparência com um Decreto, nem se usa o direito ao acesso à informação como um instrumento de barganha política. Se o aparato legal é fundamental no suporte ao direito do cidadão ao acesso à informação, o efetivo uso desta ferramenta é também um importante reforço do seu papel na gestão democrática. Diante disso, o mínimo que se pode fazer é promover a cultura da transparência por meio do acesso à informação, reforçando o seu papel fundamental para o cidadão no acompanhamento e controle da máquina pública.”
Dessa forma, de acordo com Alexsandro, é possível reverter um quadro em que o país ocupa o 27º lugar em uma lista de 123 países em uma avaliação sobre transparência pública.
O levantamento, intitulado Global Right to Information Rating, é realizado pelas ONGs Access Info Europe e Centre for Law and Democracy. Apesar de apresentar pontuação máxima no acesso, o país perde pontos ao recusar informações e deixa de ficar na frente no ranking encabeçado por países como Afeganistão, México, Sérvia e Sri Lanka.
“Quanto mais se consolida uma cultura de entendimento de que o cidadão tem direito a saber o que o poder público está fazendo, mais fica claro para servidores públicos, gestores e políticos de que o que eles produzem de informação no exercício das suas funções é um patrimônio de todos e que deve ser público”, finalizou Alexsandro Ribeiro.
CARUARU PASSOU DO 23º LUGAR PARA O 5º
Sabendo da importância da transparência pública para a população, a Prefeitura de Caruaru investiu na comunicação e passou do modesto 23º lugar para o 5º entre os municípios pernambucanos. À frente da Capital do Agreste estão Recife, Paulista, Jaboatão dos Guararapes e Bezerros. No Brasil, a cidade está na posição 195° (na pesquisa anterior, a posição era 503°). O salto positivo foi divulgado pelo Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU), que apresentou, recentemente, o resultado da Escala Brasil Transparente (EBT) – Avaliação 360°.
O anúncio fez parte das atividades comemorativas pelo Dia Internacional contra a Corrupção. A iniciativa busca verificar o grau de cumprimento de dispositivos da Lei de Acesso à Informação (LAI) e de outros normativos sobre transparência nos Estados e no Distrito Federal, além de todos os municípios com mais de 50 mil habitantes, incluindo as capitais (com base nas estimativas do IBGE em 2017). No total, foram avaliados 691 entes federativos – universo que abrange quase 70% da população brasileira.
A EBT – Avaliação 360°, diferentemente das três edições anteriores, traz uma inovação na sua metodologia. A principal diferença é que além da transparência passiva, também foi avaliada a transparência ativa. Ou seja, além da regulamentação da LAI – existência de canal (presencial e eletrônico) para solicitações de informação pelos cidadãos (SIC) e atendimento desses pedidos – a CGU mapeou como governos estaduais e municipais publicam na internet os dados sobre receitas e despesas, licitações e contratos, estrutura administrativa, obras públicas, lista de servidores, entre outros.
Todas as unidades avaliadas receberam entre 0 e 10 pontos, o que permite a geração de rankings. A EBT – Avaliação 360° revelou que 22 estados e o Distrito Federal (85% das UF) tiveram nota acima de 7. Das capitais, 93% possuem nota maior que 6, sendo que oito delas (30%) estão entre 9 e 10: Vitória (ES), Recife (PE), Curitiba (PR), Campo Grande (MS), Porto Velho (RO), Maceió (AL), Brasília (DF) e Cuiabá (MT). Com relação aos demais entes avaliados, 340 municípios (51% do total) conseguiram nota superior a 6 pontos.
No ranking geral, entre os dez entes mais bem classificados, destacam-se: quatro municípios do Espírito Santo, sendo Serra a unidade federativa com maior pontuação; quatro capitais; e três municípios com menos de 100 mil habitantes, sendo dois deles do Pará.
No critério Transparência Passiva, 602 entes federativos (81,1%) disponibilizam ferramenta eletrônica que possibilita o pedido de acesso à informação. Do universo avaliado, 36 entes atingiram a pontuação máxima no tocante ao cumprimento da LAI.
Já no critério Transparência Ativa, os 691 entes avaliados possuem portal de transparência ou seção similar em seus endereços eletrônicos. Do total, 466 (67,4%) publicam informações sobre despesas; 406 (58,7%) publicam todos os dados avaliados sobre licitações; 550 (79,6%) publicam dados detalhados sobre servidores públicos (nome, cargo e remuneração); 417 (60,4%) publicam informações sobre diárias; e 314 (45,4%) divulgam a regulamentação da LAI em local de fácil acesso. O município de Vitória (ES) foi o único ente a conseguir pontuação máxima.
A aplicação da EBT ocorreu entre julho e novembro de 2018, distribuída em três fases distintas: Avaliação, 1ª Revisão e 2ª Revisão. As notas dos entes foram calculadas pela soma de dois critérios: Transparência Passiva (e Transparência Ativa.
Para avaliação da Transparência Passiva, foi verificada a existência de canais de atendimento ao cidadão (SIC ou similar) e de um sistema, formulário eletrônico ou e-mail para envio de pedidos de acesso a informações públicas. Também entrou na avaliação a possibilidade de acompanhar o trâmite das demandas via LAI e a análise das respostas recebidas (prazo, conformidade e opção de recurso). Para isso, foram feitas três solicitações, por usuários diferentes (não identificados como funcionários da CGU). O objeto dos pedidos foi pré-definido e o mesmo direcionado a cada município e/ou estado.
Em relação à Ativa – que se refere à publicação de informações públicas na internet de maneira espontânea (proativa) – a CGU verificou, primeiramente, a existência de sites oficiais e de portais de transparência.