Os cenários, agora, apontam para uma negociação intrincada e que pode levar dias. Mas não se descarta a realização de um novo pleito se acordos fracassarem. A crise é de tal dimensão que alguns dos comentaristas ironizavam a situação: “maioria relativa para a direita, caos absoluto para a Espanha”.
Extrema-direita desaba
A eleição ainda marcou uma queda importante da extrema direita, que esperava chegar ao poder pela primeira vez desde o fim da ditadura de Francisco Franco. O resultado foi considerado como um alívio para líderes europeus, preocupados com o avanço desse movimento pelo continente.
A votação havia sido convocada depois que o governo socialista de Pedro Sanchez registrou uma dura derrota nas eleições regionais, há dois meses. Naquele momento, a extrema direita já havia multiplicado seu apoio e votos e fechou acordos com o PP. Nas regiões onde passou a fazer parte do governo, ela aboliu departamentos que lidam com meio ambiente ou certos aspectos de direitos humanos.
Mas a onda extremista não se confirmou na eleição nacional e a decisão da direita tradicional de fechar acordos com o Vox custou caro.
Em regiões como a Catalunha, o resultado ainda foi um claro “não” à entrada da extrema direita no governo central. Na opinião pública, passou a ser visto como incoerente por parte do PP buscar o voto do centro e, ao mesmo tempo, fechar acordos com os herdeiros do franquismo.
Para formar governo, uma coalizão precisa de 176 assentos no Parlamento Espanhol, algo que não obteve nem o partido no governo, o socialista PSOE, ou a direita tradicional do PP.
Com 98% dos votos apurados, os resultados são:
- Partido Popular – 136 assentos no Parlamento
- Partido Socialista – 122 assentos
- Vox – 33 assentos
- Sumar (união de partidos de esquerda) – 31 assentos
Na prática, nem uma coalizão ampla de direita e nem de todos os partidos de esquerda conseguiram votos suficientes para formar uma maioria absoluta. Pelos resultados, os blocos se dividem da seguinte forma:
- Direita: 171 assentos
- Esquerda: 172 assentos
Um partido catalão ainda somou sete lugares no Parlamento.
Considerando apenas a aliança entre os quatro principais movimentos políticos, o resultado seria:
- PP e Vox – 169 assentos
- PSOE e Sumar – 153 assentos
A reivindicação de Feijóo
O Partido Popular esperava vencer o pleito por uma margem mais ampla, o que não ocorreu. Mesmo assim, por ter aumentado seu papel no Parlamento em 47 assentos, o líder da direita insiste que ele teria a legitimidade para governar e que jamais um partido que chegou em segundo lugar na eleição saiu como o novo governo.
Mas, para formar governo, ele então dependeria necessariamente da extrema direita, além de outros aliados.
De fato, Vox – movimento ultranacionalista, racista, anti-LGBT — esperava se apresentar como uma peça fundamental para que a direita pudesse formar um governo. Mas a queda, em comparação aos resultados das eleições de 2019, surpreendeu seus dirigentes. Há quatro anos, o grupo obteve mais de 50 assentos no Parlamento, mas não fez parte da formação do governo.
Agora, o cenário político era outro e a Espanha, na avaliação de observadores, poderia ver a volta da extrema-direita no poder pela primeira desde o final da ditadura de Franco, nos anos 70. O grupo é ainda um dos principais aliados do bolsonarismo na Europa, com constante contato com Eduardo Bolsonaro.
Se Vox fizesse parte do governo, seria o quinto país europeu com a extrema direita no poder. Três deles estariam na coalizão de maioria.
Esquerda terá de negociar
Mas a esquerda contesta qualquer cenário neste sentido diante dos resultados e tentará, nos próximos dias, negociar apoio com outros partidos independentes para permitir que uma coalização mais ampla seja estabelecida. Neste caso, Pedro Sanchez poderia continuar governando.
Sua situação não será simples. Partidos catalães que podem ser aliados num novo governo socialistas alertaram que não abrirão mão de suas políticas, reivindicações e princípios.
Se não houver um acordo, porém, a Espanha poderá ter de convocar novas eleições.
Ataques cibernéticos por grupo pró-russo
A eleição ainda foi marcada por ataques cibernético contra sites e mesmo páginas oficiais do Ministério do Interior, a Junta Eleitoral e outras instituições.
Num comunicado, o grupo pro-russo NoName Hacking Group, organização clandestina próxima ao Kremlin, alegou que os ataqueis ocorriam como resposta ao apoio da Espanha ao governo de Volodymyr Zelensky, na Espanha.
Autoridades espanholas chegaram a apontar que o ataque poderia ser o maior desde o início da guerra na Ucrânia, em fevereiro de 2022.
Um caos nos serviços de transporte também ampliou as acusações mútuas entre os partidos, com a direita alegando que haveria uma conspiração do governo para evitar que eleitores pudessem chegar às urnas.