Por Dane Avanzi
A Câmara dos Deputados aprovou na noite dessa terça-feira, dia 25, o novo Marco Civil da Internet brasileira. Debatido desde o início de 2011 e turbinado ano passado por conta do “Caso Snodew”, a legislação agora passa a ser debatida no Senado para posterior sanção da Presidência da República. Embora do ponto de vista legal represente um avanço no sentido de assegurar direitos do internauta – haja vista consagrar um princípio básico da internet – na neutralidade do ponto de vista prático, pouca coisa mudará.
O conceito de neutralidade traduz-se pela igualdade dos usuários no qual tange aos conteúdos acessados. Recentemente debatido nos Estados Unidos, tal assunto foi parar na justiça no início do ano quando a Netflix, empresa que vende conteúdos de filmes a baixo custo, pagou mais a uma provedora de acesso à internet (Verizon) para priorizar a entrega de seus vídeos e filmes. Para melhor contextualizar, filmes são os arquivos mais “pesados” que trafegam na internet, e por isso, os que são mais difíceis de trafegar e que exigem maior largura de banda.
Considerando que banda é custo para as operadoras e por isso pode ser cobrada, pagando mais quem usar mais, a Justiça norte americana determinou que é licito a Netflix pagar mais à operadora. Na mesma decisão, a Justiça americana determinou que o FCC (Federal Communication Comission) é competente para incentivar a competição entre operadoras e deve arbitrar a questão com vistas a defesa dos direitos do consumidor. O assunto ainda está se desenrolando lá, e em razão disso, Tim Berners-Lee, um dos criadores da internet, festejou a disposição do governo brasileiro por ser o primeiro Estado no mundo a regular o assunto e criar uma lei específica.
Boas intenções à parte, o que muda na vida dos brasileiros? Muito pouco. Em termos práticos, a internet vai ficar mais barata? Não. Continuará existindo vários tipos de pacotes que vão definir a qualidade que o consumidor terá. Se a lei for sancionada como está pode impedir que no futuro seja cobra pelo acesso por tipo de conteúdo, fato que sem dúvida representa um avanço. Em verdade, como agora os provedores serão obrigados a armazenar informações do acesso de cada computador, pode ser que fique até mais caro, pois terão que se equipar para isso e provavelmente transferirão esse custo. E quanto à qualidade, melhorará? Isso independe de lei, mas sim da postura das autoridades brasileiras em face das operadoras.
E a espionagem, vai acabar? Não. A espionagem, uma das profissões mais antigas do mundo, continuará existindo, pois ela ocorre em grande escala nas empresas PTT (Pontos de Troca de Tráfego) nas mídias sociais, e em grandes corporações privadas norte-americanas denunciadas por Snodew. De fato, Obama vai continuar ouvindo quem bem entender. Já em pequena escala, a espionagem continuará ocorrendo nos grampos oficiais (ou não), que continuarão submetidos a ordem judicial para serem válidos, aliás, como sempre foi. Mais do mesmo.
E quanto aos conteúdos? O responsável pela publicação, não o provedor, fica integralmente responsável pelo conteúdo, devendo ser retirado após ordem judicial, exceto conteúdos ligados a pedofilia e outros de natureza sexual, que devem ser removidos imediatamente.
De um modo geral, a lei dá um passo no sentido de garantir direitos já consagrados pela Constituição Federal Brasileira no ambiente digital. Para seu sucesso, resta-nos torcer para que as autoridades brasileiras a usem em benefício do consumidor, fiscalizando de perto as operadoras e provedores de acesso de modo a evitar o aumento nas tarifas cobradas ao povo brasileiro.
Dane Avanzi é advogado, empresário do setor de engenharia civil, elétrica e de telecomunicações. É diretor superintendente do Instituto Avanzi, ONG de defesa dos direitos do consumidor de telecomunicações e vice-presidente da Aerbras – Associação das Empresas de Radiocomunicação do Brasil.