OPINIÃO: O ‘erro’ da TV Globo

Por DIMITRE BEZERRA ALMEIDA*

Foi engraçado e, ao mesmo tempo, trágico o editorial do Jornal Nacional de ontem (2) compartilhando uma matéria de “O Globo” que reconhece o “erro” da família Marinho em ter apoiado o golpe militar de 1964. “Erro”? Só isso?

A pequena TV Globo (que depois veio tomar parte do império midiático chamado Rede Globo), integrante das organizações Roberto Marinho, se esbaldou das benesses do poder golpista, inclusive para cooptar anunciantes e inviabilizar de todas as formas a TV Tupi (de Assis Chateaubriand) e a TV Record, canais televisivos que até então eram grandes.

Em virtude do “erro” da Rede Globo, ocultaram-se atentados, perseguições, torturas, como um braço fiel do militarismo dentro da mídia nacional. Censurou-se o conhecimento ao que estava acontecendo no mundo, publicando-se apenas aquilo que era enviado pela Reuters, segundo os interesses dos militares amparados pelos Estados Unidos.

O reconhecimento do “erro” não exime a Rede Globo do imenso mal feito ao Brasil. É uma pena que o rosto bonito do Willian Bonner e a sua voz doce sejam suficientes para convencer a muitos que tudo se tratou apenas de um “pequeno” equívoco histórico, de um mal-entendido agora esclarecido. A mim ele apenas fez um grande insulto.

* Dimitre Bezerra Almeida é advogado, consultor em administração pública municipal, especialista em prática do processo, mestre em gestão pública e doutorando em direito penal.

OPINIÃO: Em vez Havana?

Por PAULO MOREIRA LEITE*

Do ponto de vista da saúde pública, temos um quadro conhecido. Faltam médicos em milhares de cidades brasileiras, nenhum doutor formado no país tem interesse em trabalhar nesses lugares pobres, distantes, sem charme algum – nem aqueles que se formam em universidades públicas sentem algum impulso ético de retribuir alguma coisa ao país que lhes deu ensino, formação e futuro de graça.

Respeitando o direito individual de cada pessoa resolver seu destino, o governo Dilma decidiu procurar médicos estrangeiros. Não poderia haver atitude mais democrática, com respeito às decisões de cada cidadão.

O Ministério da Saúde conseguiu atrair médicos de Portugal, Espanha, Argentina, Uruguai. Mas continua pouco. Então, o governo resolveu fazer o que já havia anunciado: trazer médicos de Cuba.

Como era de prever, a reação já começou.

E como eu sempre disse neste espaço, o conservadorismo brasileiro não consegue esconder sua submissão aos compromissos nostálgicos da Guerra Fria, base de um anticomunismo primitivo no plano ideológico e selvagem no plano dos métodos. É uma turma que se formou nesta escola, transmitiu a herança de pai para filho e para netos. Formou jovens despreparados para a realidade do país, embora tenham grande intimidade com Londres e Nova York.

Hoje, eles repetem o passado como se estivessem falando de algo que tem futuro.

Foi em nome desse anticomunismo que o país enfrentou 21 anos de treva da ditadura. E é em nome dele, mais uma vez, que se procura boicotar a chegada dos médicos cubanos com o argumento de que o Brasil estará ajudando a sobrevivência do regime de Fidel Castro. Os jornais, no pré-64, eram boicotados pelas grandes agencias de publicidade norte-americanas caso recusassem a pressão americana favorável à expulsão de Cuba da OEA. Juarez Bahia, que dirigiu o Correio da Manhã, já contou isso.

Vamos combinar uma coisa. Se for para reduzir economia à política, cabe perguntar a quem adora mercadorias baratas da China Comunista: qual o efeito de ampliar o comércio entre os dois países? Por algum critério – político, geopolítico, estético, patético – qual país e qual regime podem criar problemas para o Brasil, no médio, curto ou longo prazo?

Sejamos sérios. Não sou nem nunca fui um fã incondicional do regime de Fidel. Já escrevi sobre suas falhas e imperfeições. Mas sei reconhecer que sua vitória marcou uma derrota do império norte-americano e compreendo sua importância como afirmação da soberania na América Latina.

Creio que os problemas dos cidadãos cubanos, que são reais, devem ser resolvidos por eles mesmos.

Como alguém já lembrou: se for para falar em causas humanitárias para proibir a entrada de médicos cubanos, por que aceitar milhares de bolivianos que hoje tocam pedaços inteiros da mais chique indústria de confecção do país?

Denunciar o governo cubano de terceirizar seus médicos é apenas ridículo, num momento em que uma parcela do empresariado brasileiro quer uma carona na CLT e liberar a terceirização em todos os ramos da economia. Neste aspecto, temos a farsa dentro da farsa. Quem é radicalmente a favor da terceirização dos assalariados brasileiros quer impedir a chegada, em massa, de terceirizados cubanos. Dizem que são escravos e, é claro, vamos ver como são os trabalhadores nas fazendas de seus amigos.

Falar em democracia é um truque velho demais. Não custa lembrar que se fez isso em 64, com apoio dos mesmos jornais que 49 anos depois condenam a chegada dos cubanos, erguendo o argumento absurdo de que eles virão fazer doutrinação revolucionária por aqui. Será que esse povo não lê jornais?

Fidel Castro ainda tinha barbas escuras quando parou de falar em revolução. E seu irmão está fazendo reformas que seriam pura heresia há cinco anos.

O problema, nós sabemos, não é este. É material e mental.

Nossos conservadores não acharam um novo marqueteiro para arrumar seu discurso para os dias de hoje. São contra os médicos cubanos, mas oferecem o quê? Médicos do Sírio Libanês, do Einstein, do Santa Catarina?

Não. Oferecem a morte sem necessidade, as pragas bíblicas. Por isso não têm propostas alternativas nem sugestões que possam ser discutidas. Nem se preocupam. Ficam irresponsavelmente mudos. É criminoso. Querem deixar tudo como está. Seus médicos seguem ganhando o que podem e cada vez mais. Está bem. Mas por que impedir quem não quer receber nem atender?

Sem alternativa, os pobres e muito pobres serão empurrados para grandes arapucas de saúde. Jamais serão atendidos, nem examinados. Mas deixarão seu pouco e suado dinheiro nos cofres de tratantes sem escrúpulos.

Em seu mundo ideal, tudo permanece igual ao que era antes. Mas não. Vivemos tempos em que os mais pobres e menos protegidos não aceitam sua condição como uma condenação eterna, com a qual devem se conformar em silêncio. Lutam, brigam, participam. E conseguem vitórias, como todas as estatísticas de todos os pesquisadores reconhecem. Os médicos, apenas, não são a maravilha curativa. Mas representam um passo, uma chance para quem não tem nenhuma. Por isso são tão importantes para quem não tem o número daquele doutor com formação internacional no celular.

O problema real é que a turma de cima não suporta qualquer melhoria que os debaixo possam conquistar. Receberam o Bolsa Família como se fosse um programa de corrupção dos mais humildes. Anunciaram que as leis trabalhistas eram um entrave ao crescimento econômico e tiveram de engolir a maior recuperação da carteira de trabalho de nossa história. Não precisamos de outros exemplos.

Em 2013, estão recebendo um primeiro projeto de melhoria na saúde pública em anos com a mesma raiva, o mesmo egoísmo.

Temem que o Brasil esteja mudando, para se tornar um país capaz de deixar o atraso maior, insuportável, para trás. O risco é mesmo este: a poeira da história, aquele avanço que, lento, incompleto, com progressos e recuos, deixa o pior cada vez mais distante.

É por essa razão, só por essa, que se tenta impedir a chegada dos médicos cubanos e se tentará impedir qualquer melhoria numa área em que a vida e a morte se encontram o tempo inteiro.

Essa presença será boa para o povo. Como já foi útil em outros momentos do Brasil, quando médicos cubanos foram trazidos com autorização de José Serra, ministro da Saúde do governo de FHC, e ninguém falou que eles iriam preparar uma guerrilha comunista. Graças aos médicos cubanos, a saúde pública da Venezuela tornou-se uma das melhores do continente, informa a Organização Mundial de Saúde. Também foram úteis em Cuba.

Os inimigos dessas iniciativas temem qualquer progresso. Sabem que os médicos cubanos irão para o lugar onde a morte não encontra obstáculo, onde a doença leva quem poderia ser salvo com uma aspirina, um cobertor, um copo de água com açúcar. Por isso incomodam tanto. Só oferecem ameaça a quem nada tem a oferecer aos brasileiros além de seu egoísmo.

* Paulo Moreira Leite é diretor da Sucursal da revista ISTOÉ em Brasília.

OPINIÃO: As raízes da crise egípcia

Por EMIR SADER*

A chamada “primavera árabe” foi, de forma afoita, chamada por alguns de uma revolução. Foi muito importante, principalmente porque quebrou um eixo fundamental da política dos EUA para a região – a ditadura de Mubarak. Não por acaso o país ocupa o segundo lugar na lista de receptores de apoio militar dos EUA, só superado por Israel.

Mas como fenômeno político, foi a vitória de uma luta antiditatorial. Permitiu que novas forças laicas aparecessem, somadas à força mais tradicional da oposição à ditadura – os islâmicos, organizados na Irmandade Muçulmana.

As eleições tiveram o triunfo dos islâmicos, que derrotaram, por estreita margem, no segundo turno, um candidato ligado à ditadura do Mubarak. Eleito Morsi, foi convocada uma Assembleia Constituinte, com maioria islâmica, mas um peso importante das novas forças laicas.

O erro mais grave de Morsi foi permitir que fosse elaborada e aprovada uma Constituição conforme os valores islâmicos, que impõe esses seus valores ao conjunto da sociedade, dividida entre forças islâmicas e laicas. Somada à crise econômica – que promoveu uma forte pressão do FMI para a aceitação de um empréstimo, com a correspondente Carta de Intenções, que Morsi rejeitou, consciente do que significaria para o país, mas sem elaborar alternativas – o Egito se viu envolvido em nova onda de mobilizações, agora contra sua administração.

Sucederam-se as mobilizações gigantescas, dos dois lados, a favor e contra o governo, numa situação de empate político. Que foi desempatado pela ação do Exército, que tinha sobrevivido incólume ao fim da ditadura e agiu para derrubar o governo do Morsi.

Um golpe militar, mesmo se com apoio popular. Setores que haviam se mobilizado saudaram o golpe, acreditando que poderiam derrotar os islâmicos e acercar-se ao poder.

Mas a capacidade de resistência dos islâmicos terminou rapidamente com essa ilusão. A repressão militar não se fez tardar e a polarização entre o Exército e a Irmandade Muçulmana se impôs.

Os EUA, incomodados, porque têm no Exército seu principal aliado – por isso Obama não pode usar a palavra golpe, porque estaria obrigado a suspender os auxílios militares ao Exército – não podem aparecer publicamente apoiando a interrupção de um processo democrático, mas tampouco podem condenar o regime.

O pior dos mundos se impôs: militarização do país – com o estado de sítio e a nomeação de governadores ligados ao militares nas províncias – e resistência dos islâmicos, com os setores laicos deslocados.

A primavera egípcia desembocou neste outono.

* Extraído do Blog do Emir

OPINIÃO: Democracia representativa e participação

Por MARCUS PESTANA*

Um tsunami de cidadania, indignação e participação explodiu nas ruas em junho e julho. De forma inesperada e imprevisível, surpreendeu lideranças políticas e sociais, intelectuais, analistas. O esforço para a compreensão do impressionante e inovador fenômeno ainda vai consumir rios de tinta em artigos, entrevistas e estudos. Algumas coisas importantes foram escritas por FHC, Fernando Gabeira, Luiz Werneck Vianna, André Lara Resende, entre outros. Uma das questões mais interessantes, mas não propriamente nova, é a recolocação no Brasil, em novo patamar, das discussões sobre as relações entre Estado e sociedade e as dimensões de representação e participação direta na democracia.

Instituições, partidos políticos e lideranças reagiram, num primeiro momento, de forma atabalhoada, acuados e traumatizados. Algumas mudanças foram introduzidas, alguns avanços conquistados. Mas o mais importante foi a verdadeira chacoalhada na realidade dominada, até então, por uma impressão de que tudo ia bem no país e que a hegemonia petista, cada vez mais pragmática e sem conteúdo transformador, sustentada no mais puro patrimonialismo e fisiologismo, teria vida longa.

Da sua parte os movimentos de rua apresentaram no “day after” uma natural dificuldade de fixação de agendas e de representação para a construção do diálogo com governantes e instituições.

Não houve um único movimento, como foram o das “Diretas Já” e o pelo afastamento de Collor. Foram múltiplos movimentos, expressando angústias e expectativas diversas, multifacetados, sem agenda ou dinâmica únicas, espontâneos em seu inicio. Cidadãos independentes, jovens sem vinculações, famílias inteiras se misturaram a skinheads, anarco-punks, black blocs, militantes “clandestinos” de diversos partidos rechaçados em suas tentativas de participação aberta. Sem palanque, sem palavras de ordem unificadas, sem objetivo estratégico claro, sem um caminho previamente imaginado para a conquista de utopias perseguidas ou de plataformas políticas consensuais.

Além disso, é preciso não absolutizar o sentido e o significado do movimento, glamourizar todas as suas faces e permanecer perplexo e acuado quando valores essenciais para a democracia são agredidos. Vale lembrar que democracia é expressão da maioria, e que uma minoria ruidosa não pode impor sua lógica à maioria por vezes silenciosa. A violência defendida como instrumento legítimo por alguns segmentos, por exemplo, não obteria sequer 1% de apoio em eleições livres e democráticas.

Diante de um fenômeno novo que abalou profundamente o status quo, a precipitação de intervenções eivadas de populismo, demagogia e oportunismo é escolha equivocada, como suposta “resposta às ruas”. A democracia e a economia brasileira amadureceram muito nas últimas décadas e é preciso firmeza e solidez para defender o patrimônio coletivo conquistado. Evidente, com as necessárias e inevitáveis correções de rumo.

* Marcus Pestana é presidente do PSDB de Minas Gerais e deputado federal. Texto publicado originalmente no site Congresso em Foco.

OPINIÃO: A dor da injustiça

Por GABRIEL CHALITA*

Há algum tempo, escrevi um artigo sobre a dor da injustiça. Uma reflexão a respeito de valores éticos fundamentais para a harmonia nas relações humanas. O tema, no entanto, é atual e válido de ser repensado.

Diariamente, aprendemos e ensinamos. Estamos todos matriculados na escola da vida. E, nessa escola, com humildade, amadurecemos. Basta que prestemos atenção no outro, em sua dor e em sua capacidade de superação. E que prestemos atenção em nós mesmos e na necessidade de sermos justos.

Certa vez, ouvi o depoimento de uma cozinheira acusada de ter furtado uma pulseira de ouro. Entre lágrimas, ela tentava convencer a patroa de que jamais havia cometido aquele delito. A mulher, por sua vez, dizia que as lágrimas eram uma forma de esconder o furto.

Em dado momento, a funcionária não mais insistiu. Na solidão da injustiça, entrou no quarto para arrumar suas coisas. Chorou sua história de dor e de necessidade. Enquanto a patroa afirmava que não a denunciaria desde que ela não a atormentasse na Justiça, entrou a filha pedindo um sanduíche. No pulso esquerdo, a pulseira. Foi quando a funcionária chorou ainda mais. Como dói a injustiça! A patroa, rispidamente, disse a ela que parasse com o choro e voltasse ao trabalho. Fora apenas um mal-entendido. Recomposta, a cozinheira agradeceu e disse que nada mais tinha a fazer naquela casa.

Sem muito alarde, ela saiu e, no dia seguinte, arrumou emprego num restaurante. Tudo aconteceu em um grupo de oração. O padre pediu que as pessoas se cumprimentassem e se apresentassem. A senhora ao lado disse que tinha um restaurante, e ela contou que era cozinheira. Uma nova vida começou.

Assim como ouvi esse testemunho, ouço muitos outros que servem de inspiração para que aprendamos a ser justos. A história dessa mulher nos ensina a ter mais delicadeza nas relações. É triste sofrer a dor da injustiça. Todos nós erramos, mas, se tomarmos um pouco de cuidado, nosso erro não será tão doloroso ao outro nem a nós mesmos.

* Gabriel Chalita é deputado federal pelo PMDB-SP. Texto publicado originalmente no Diário de S. Paulo.

OPINIÃO: Dilma insiste no erro

Por MAURICIO DIAS*

Os aliados reclamam por ela não fazer política. Os adversários criticam por fazer política demais. Ela sofre restrições na base governista, onde se diz que a presidenta não gosta do partido dela, o PT, e menos ainda dos coligados: um amontoado de 14 legendas unidas por todos os tipos de interesses. Inclusive os legítimos.

Condenada pelos oposicionistas por contar com 39 ministérios para atender partidários, vê repentinamente o PMDB, cujo maior líder é o vice-presidente da República, Michel Temer, propor a redução do número de ministros para atender o que pensa ser a voz das ruas. Um jogo de cena explicável. Estava escrito. Os dois maiores partidos da base governista, PMDB e PT, entrariam em choque em busca da maioria na Câmara na eleição de 2014.

Há erros e acertos nessas versões criadas a partir de verdades e mentiras que cercam o modelo de Dilma Rousseff governar após dois anos e meio de poder. Duas palavras podem compor o lema dela: seriedade e inexperiência. Ela paga por ambas. Por essas e outras razões vem sendo tragada pelo próprio ambiente que a elegeu. Essa moldura se consolidou no momento em que as manifestações deixaram de ser virtuais.

Nos últimos dias, a presidenta aplicou um “sossega leão” nos aliados. Liberou 2 bilhões de reais do Orçamento para senadores e deputados. Com isso, espera manter vetos feitos à supressão de 10% de multa sobre o FGTS na demissão sem justa causa de trabalhadores. Há, ainda, a MP do “Mais Médicos” e a questão dos royalties do petróleo.

Dilma sempre fez política. No começo, contra a ditadura. Perdeu. De volta, filiou-se ao PDT de Brizola. Migrou para o PT, pelo qual disputou a Presidência. Ganhou. Apesar da autoridade do criador, Lula, a criatura não desceu redonda pela goela dos aliados. Em alguns momentos, ela tentou mudar o rumo das coisas. Ora negociou, ora impôs. Ora contida, ora agressiva.

Ao fim, o saldo neste momento não é bom. Eleita em uma disputa na qual teve de escamotear convicções, como no caso do aborto, foi mudada em vez de mudar.

Logo nos primeiros meses de governo afastou ministros acusados de “malfeitos”, para usar uma expressão cara à presidenta. Os atingidos engoliram a seco.

A queda na popularidade, no ponto em que a economia está, enfraqueceu a autoridade dela perante aliados rebeldes de setores petistas.

Olhando com lupa é possível ver a diferença numérica na ascensão e na queda dela. Dilma obteve 48% dos votos nominais no primeiro turno da eleição de 2010. Chegou a ter, no ápice do sucesso, uma avaliação de 65% de “ótimo e bom”. Isso significa que, ao longo do governo, ganhou 17 pontos a mais do que teve na eleição. Na queda, perdeu 18 pontos do primeiro turno e mais 17 pontos que tinha conquistado no segundo, quando alcançou 58% dos votos válidos.

No balanço de prós e contras, neste momento, ela perde o confronto. Cercada, ela cedeu. Agora defende o modelo que nasceu da sua entrega. A insistência, no caso, é fatal.

* Mauricio Dias é jornalista, editor especial e colunista da revista CartaCapital.

OPINIÃO: Criticar governo, sim. Capitalismo, nunca

Por NIRLANDO BEIRÃO*

Dá para notar que os protestos de rua estão perdendo a mística, o encanto, para quem está do lado de lá deles – digo, a mídia oligárquica e, por extensão, aquela facção ameba, mais influenciável, da chamada opinião pública. Mais do que perder o fascínio, as manifestações começam a provocar descrença e irritação, como se a explosão espontânea e legítima das massas estivesse sendo agora apropriada por uns grupelhos descabelados de radicais e arruaceiros.

Não tenho mais idade para me regozijar com cenas de depredação, mas me irrita a hipocrisia dos que aplaudiam antes e agora criticam. Tenho até um pequeno, descompromissado palpite, a respeito desse divórcio que se deu entre o momento em que o protesto era uma beleza e o momento em que o protesto passou a ser um horror. Nada melhor, aliás, para balizar essa reviravolta, do que a cobertura, sempre tão isenta, sempre tão imparcial, do jornalismo eletromagnético da Globo e a dos dinossauros de papel.

Meu palpite me diz: enquanto a raiva se voltava contra o governo e os governantes, “essa infâmia de políticos corruptos”, “a dona Dilma”, “a turma do mensalão”, aí o partido da mídia se deliciava. As multidões ululantes vociferavam, justificadamente, contra a péssima qualidade dos serviços públicos, primeiro os transportes, depois a saúde, e a educação, e a segurança, e tudo o mais, se é por aí, ok, perfeito, abaixo os podres poderes, o Estado é o mal maior.

De repente, a agenda parece ter se ampliado. Se é para discutir a indigente situação dos serviços públicos no Brasil, por que não se ocupar também da sofrível – para dizer o mínimo – prestação de serviços privados?

Existe tão grande diferença assim entre o malfalado SUS e certos hospitais particulares onde o paciente é obrigado a pagar fortunas?

As universidades particulares, com suas mensalidades que pesam uma tonelada no bolso, são exemplos da excelência pedagógica de Harvard e de Cambridge?

E os serviços de telefonia, fixa e móvel?

E as filas dos bancos, aquilo lá é um exemplo de respeito ao cidadão?

E as companhias aéreas, com seu sistemático desrespeito ao viajante, sem falar dos golpezinhos que costumam dar em seus sites de contravenção?

Penso na indústria nacional, obsoleta, atrasada, sem nenhuma musculatura física ou criatividade mental para competir no mundo, indústria cujos produtos são um lixo (ressalvo os aviões da Embraer e as sandálias havaianas), incapaz de inovar tecnologicamente (que inveja da Coreia!), sempre queixosa, abúlica, pondo da culpa nos impostos e na infraestrutura.

Ah, e há o espinho que mais dói. Os rebeldes da rua – os que ainda estão aí – insistem em debater também a péssima qualidade da informação que se produz e se veicula no Brasil. Por isso as emblemáticas manifestações à porta da Globo, por isso a saudável insistência em desconfiar do viés partidário e, mais uma vez, eleitoreiro dos veículos que dizem falar em nome do povo.

Nesse Brasil de frases feitas e ideias curtas, o culpado é, tem de ser, sempre o governo e os políticos, mesmo que eles sejam eleitos por nós e mesmo sabendo-se que sem política não há democracia.

A mídia oligárquica nunca foi muito chegada à democracia. Menos ainda ao povo. A tarefa dela, agora, é tentar dizer que há povo e povo. Aquele que manifesta com as ideias das quais a gente gosta deve ser respeitado. Aquele de quem a gente discorda não passa de um bando de vândalos.

* Nirlando Beirão é editor especial da seção QI da revista CartaCapital.

OPINIÃO: O índice de transparência parlamentar

Por JORGE MARANHÃO*

Como se viu pelos noticiários esta semana, a presidente Dilma Rousseff acaba de autorizar nada menos do que R$ 6 bilhões para as famosas emendas parlamentares, aquelas que cada deputado tem direito para a realização de benfeitorias em seus redutos eleitorais. Isso, no mesmo momento em que contingencia mais de R$ 4,5 bilhões para a segurança nacional, o Ministério da Defesa.

Para além de não se entender para que serve o Estado, o problema, mais uma vez, é a transparência na utilização dessas emendas, frequentemente suspeitas de desvios ou o puro e simples favorecimento de aliados políticos, não importando muito as necessidades reais dos cidadãos.

Por isso, a mais recente iniciativa do Instituto de Fiscalização e Controle, o IFC, é ainda mais oportuna. O IFC acaba de lançar o sistema do Índice de Transparência Parlamentar. Para quem não sabe, o IFC é uma iniciativa de várias organizações da sociedade, como a Auditar, dos auditores externos federais, a Assecor, dos servidores de planejamento e orçamento, a Unasus, dos auditores do SUS, além das entidades de auditores e dos engenheiros e arquitetos da Caixa Econômica (respectivamente Audicaixa e Aneac). Ou seja, especialistas em controle e fiscalização de dinheiro público. E a missão da organização é justamente essa: criar iniciativas e projetos que levem aos cidadãos um pouco da expertise desses especialistas, para que eles também se tornem fiscais de mandatos e orçamentos públicos.

O Índice de Transparência Parlamentar foi desenvolvido para avaliar o quanto os políticos realmente estão preocupados em dar satisfação aos seus eleitores sobre o que fazem com os mandatos. Ou se estão apenas “fazendo cena”.

Através de sete quesitos principais, os cidadãos eleitores podem ter um bom panorama de como se comporta o político eleito em seu mandato. São eles: atuação direta do parlamentar (frequência, participação em comissões, prestação de contas de verbas indenizatórias e de gabinete), atuação indireta do parlamentar (indicações ao governo para cargos de gestão – secretário e administrador; indicações para a estrutura da casa legislativa), acessibilidade do site na internet (conteúdo em formato aberto, acessibilidade para portadores de deficiência, mecanismos eficiente para buscas), governança do mandato (divulgação do organograma de gabinete, incluindo as funções de cada servidor, do plano estratégico do mandato, das principais promessas de campanha, da agenda oficial, do cumprimento das principais promessas de campanha), controle social (disponibilização de canais para participação da sociedade, conselho de gestão com participação da sociedade organizada), prestação de contas do processo eleitoral (se divulga doadores de campanha, última declaração de imposto de renda e os gastos da campanha) e atuação nas mídias sociais (divulgação de ações e interação do político com os cidadãos nas mídias sociais).

Por enquanto, a fase inicial do sistema do Índice de Transparência Parlamentar está acompanhando os mandatos dos deputados distritais em Brasília. A plataforma já está sendo preparada para acompanhar vereadores dos municípios de Águas Lindas (GO) e Curitiba (PR). Para variar, os políticos brasilienses estão devendo. Na média, a Câmara Legislativa do Distrito Federal obteve apenas 3,6 pontos de transparência, numa escala que vai até 10. Com esta nota, não se passa hoje em nenhum concurso público por aí.

O que já passou foi a hora dos nossos políticos e gestores entenderem que dar satisfação do que fazem com o dinheiro público é um caminho que não tem mais volta. A luta da cidadania por transparência e ética na política veio para ficar.

Vale a pena conhecer a nova página do sistema do Índice de Transparência Parlamentar, do IFC. Quem sabe vocês não se animam a aplicar a ideia por outras cidades?

* Jorge Maranhão é publicitário, consultor e escritor. Atualmente dirige o Instituto de Cultura de Cidadania A Voz do Cidadão. Texto publicado originalmente no site Congresso Em Foco

OPINIÃO: Pela redução da jornada de trabalho

Por ADILSON LIRA*

É comum se ouvir de nossa própria gente que somos um povo preguiçoso e que as trabalhadoras e os trabalhadores pelo mundo afora têm jornada de trabalho maior que a nossa. Essa é a mais absurda mentira! Não acredite nisso. Temos no Brasil, ainda hoje, uma das maiores jornadas de trabalho do mundo – são 44 horas, sem contar as famigeradas horas extras, que são realizadas semanalmente por cerca de 40% dos/das trabalhadores/as no nosso país.

A jornada de trabalho na Alemanha, há muito, é de 38 horas semanais em média. Já na França e na Espanha, a jornada semanal não passa de 35 horas. Os Estados Unidos, desde 1930, têm jornada semanal de 40 horas. Até o Japão, que muitos brasileiros usam como exemplo de “povo trabalhador”, tem uma jornada menor que a nossa. Lá não se trabalha mais que 40 horas semanais.

Outro dado interessante de se analisar é o que trata da quantidade de horas extras efetuadas pelos trabalhadores brasileiros. Nada menos que 50% da nossa mão de obra empregada se submete ao trabalho em horário extraordinário, numa clara demonstração de que é possível empregar muito mais gente e parar de exigir jornada extra dos trabalhadores brasileiros.

Outra falácia que os donos do capital incutiram nas cabeças de nossa gente foi dizer que o Brasil tem muitos feriados. Bem, apenas como exemplo, volto a citar o Japão. Lá existem simplesmente 15 feriados nacionais. Eles também têm férias anuais.

Desmascaradas as falácias quanto a sermos um povo preguiçoso e que trabalha menos que o resto do mundo, queremos discorrer um pouco sobre a tese da redução da jornada de trabalho das atuais 44 horas semanais para 40 horas, sem a diminuição dos salários.

Em primeiro lugar, é interessante lembrar que o avanço científico e tecnológico não deve servir apenas para aumentar o lucro do capital privado, mas, principalmente, para reduzir a jornada de trabalho, permitindo aos trabalhadores e trabalhadoras dedicar mais tempo à família, à formação, à leitura e ao lazer (recreação, prática de esportes, cinema, teatro, etc.).

E não pensem que estamos falando de ideias de comunistas ou socialistas. Há cerca de 20 anos, um capitalista norte-americano (infelizmente não lembro seu nome para lhe dedicar o crédito) escreveu um artigo no qual defendia a redução sistemática da jornada de trabalho, principalmente devido ao avanço tecnológico e mecanização da mão de obra, pois, com a tecnologia aplicada ao mercado de trabalho, aquilo que era produzido numa empresa com 100 empregados, hoje é efetuado com apenas dez.

O capitalismo simplesmente demite os 90 trabalhadores excedentes. Porém, se queremos ter uma visão diferenciada de mundo e acabar com qualquer forma de exploração, devemos defender o inverso – ao contrário de demitir pessoas, reduzir a jornada de trabalho sem baixar os salários, afinal, o lucro permanece o mesmo ou até aumenta para o capital.

Portanto, defender a redução sistemática da jornada de trabalho é defender históricas bandeiras de luta da esquerda mundial, tais como liberdade, cidadania plena e justiça social. É isso. E tenho dito.

* Adilson Lira é advogado e dirigente do PT Caruaru.

OPINIÃO: Somente a sociedade é soberana na sua indignação

Por CARLOS HENRIQUE ABRÃO*

A reabilitação da política deve começar pelo fim do voto obrigatório, inaceitável em qualquer democracia, cuja sociedade tem o direito de escolher seus representantes.

Não é sem tempo que somente depois de milhares de manifestações, a nossa classe política diagnosticou a falta de diálogo com o povo e esse intercâmbio é fundamental para o fortalecimento das instituições.

Com o término do voto obrigatório, todos seremos livres e libertos do preconceito de sanções absolutamente ilegais para aqueles que julgam não ter candidatos que os credencie, além disso os partidos políticos precisam ser reduzidos até o máximo de seis, a reeleição acabar de uma vez por todas, emprestando o mandato de cinco anos, compatível com a incipiente democracia das nações latino-americanas.

A suplência não pode ter viés de parentesco, mas de pessoas que sejam identificadas e consigam mostrar algum tipo de utilidade para o serviço público.

Anualmente os políticos teriam que prestar contas de suas atividades e isso daria maior transparência nas suas atitudes, mais do que isso, as plataformas de campanha necessitam registro para acompanhamento de tudo aquilo dito no transcorrer da candidatura e sua executoriedade.

O completo e total fim do nepotismo é fundamental, o dinheiro de financiamento de campanha, fato é, não pode ser proveniente de poucas empresas que têm grandes e inconfessáveis interesses na máquina do Estado, partidos que não conseguirem um mínimo de votos ao longo das eleições também seriam extintos, as Cortes eleitorais viriam ao encontro dos interesses da sociedade e demonstrariam como as contas são feitas e prestadas antes, durante e depois da eleição.

As regras do jogo que hoje temos não funcionam e somente privilegiam um núcleo pequeno, afeto aos donos do poder. Horário político obrigatório deve, igualmente, ser revisto, não há necessidade que os meios de comunicação cedam espaços para que partidos participem, muito bem teriam formas alternativas, mais ainda quando, na era da informática, todos têm acesso aos dados concretos, a direção do partido, isto é essencial, não pode ficar nas mãos de apenas uma pessoa por longos anos, a mudança é de rigor, e com critérios de participação efetiva de todos que o elegem.

Afinal de contas, hoje nossos partidos não passam de delegações que representam aos seus próprios interesses, vêm com discursos fortes e veementes durante as campanhas, mas, passado o tempo e depois de algum período, tudo se transforma e o contato com o eleitor se faz nas vésperas de nova eleição.

Se a reeleição para presidente deve acabar, igualmente para os demais cargos de representação se permitiria apenas uma reeleição e depois um intervalo mínimo, espécie de quarentena, a fim de propiciar, aos demais, oportunidades iguais.

Todos sabemos que os candidatos com desenvoltura econômica têm maior probabilidade de serem eleitos, o que não acontece com aqueles desprovidos de recursos financeiros.

Quem quiser se apresentar candidato, basta que tenha ficha limpa, não precisa de um partido político, mas pode se inscrever livre e independentemente, sem estar preso à ideologia ou à camisa de força de obrigações pouco conhecidas da população.

Os valores éticos e morais estão distantes de nossa política, eis as causas mais desafiadoras dos movimentos de rua e as passeatas incessantes, a fim de que nossos governantes não pensem centralizadores de suas ideias ou aproveitadores da conjuntura.

O tempo de transformação pede uma constante vigilância e os desenfreados gastos oneram por demais o endividamento público.

Não há necessidade alguma de fazermos plebiscito para as reformas, mas sim termos a coragem de tocar na ferida e pretendermos voos de qualidade para um futuro promissor.

As palavras do papa Francisco são no sentido de dignificar a política, no propósito de exterminar a fome e a falta de ensino para as crianças, dar assistência à terceira idade e construir uma juventude, hospedada em valores que ultrapassam o materialismo e os confortos duvidosos da globalização.

Sem uma reviravolta na política brasileira, as esperanças, para uma guinada, reduzem-se enormemente. Somente a sociedade é soberana na sua indignação, e toda a governabilidade sem credibilidade é um vazio impreenchível de egoísmo e desvios em detrimento do interesse público.

* Carlos Henrique Abrão é desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo. Texto publicado originalmente no site Consultor Jurídico