Compartilhar, um verbo que o MEC não conjuga

Rubens F. Passos*

Neste início de novo governo, além das reformas estruturais (tributária, trabalhista, previdenciária e fiscal), é necessário consertar de imediato algumas questões pontuais que vinham prejudicando setores prioritários. Uma delas refere-se à Base Nacional Comum Curricular (BNCC), em fase de debate e consultas públicas, e à reforma da estrutura do ensino, em discussão no Ministério da Educação e no Congresso. O primeiro problema é a demora nesse processo, considerando que a precariedade da educação pública é antiga e recorrente. Portanto, estamos muito atrasados na busca das soluções.

Entretanto, o viés mais grave dessa situação diz respeito ao distanciamento dos professores, coordenadores e diretores de escolas. Por mais que se façam audiências públicas e consultas, o Magistério, que conhece em profundidade a realidade e, em cada escola, desenvolve soluções e boas ideias, acaba alijado do processo. Tem sido assim durante décadas. Por essa razão, a estrutura e os currículos nacionais não atendem à meta de conferir qualidade ao ensino público.

Numa era de absoluta interatividade conferida pela internet, computadores, celulares, tablets e as comunicações em geral, é inadmissível que não se compartilhem as melhores experiências práticas das escolas de todo o Brasil, multiplicando-as nas redes estaduais e municipais de educação. A soma de modelos pedagógicos eficazes, testados no “laboratório” prático da sala de aula, certamente resultaria numa estrutura mais eficiente e de qualidade, numa resposta à altura das demandas brasileiras na área do ensino.

Não são produtivas soluções que venham de cima para baixo, mesmo que referendadas por consultas e audiências públicas. Ouvir o Magistério e conhecer as soluções concretas que nascem nas escolas de todo o País talvez seja um caminho muito mais produtivo e rápido para que tenhamos um sistema público de ensino que reduza o fosso existente em relação à educação particular. Não podemos continuar convivendo com tamanha assimetria num setor decisivo para a igualdade de oportunidades, um preceito essencial da democracia.

Por isso, é de se lamentar o MEC não ter uma plataforma na internet para que as boas experiências das escolas de todo Brasil possam ser acessadas por todos e colocadas em prática em maior número de estabelecimentos. Há esforços da própria sociedade, do Terceiro Setor e do Magistério nesse sentido, com a disseminação de modelos e experiências. No entanto, isso é insuficiente num país do tamanho do Brasil, com 5.570 municípios e imensa diversidade e riqueza culturais. Ninguém melhor do que os professores, coordenadores e diretoras das escolas para conhecer em profundidade a cultura, peculiaridades e necessidades locais dos alunos e as demandas específicas para a melhoria do ensino.

É necessário que o MEC encampe essas experiências positivas, as valide e as disponibilize em dimensão nacional, pois continuamos com graves problemas na educação. Segundo o Censo Escolar de 2015, ainda temos três milhões de brasileiros entre quatro e 17 anos fora da escola. Além disso, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD/IBGE) mostra que apenas 22,4% dos jovens de famílias de baixa renda concluem o Ensino Médio até os 19 anos, idade limite para esta etapa.

Além disso, o Brasil é o 60º colocado, dentre 76 nações listadas, no ranking de educação da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Em outro estudo desse organismo, nosso país é um dos dez com mais alunos com baixo rendimento escolar em matemática, leitura e ciência. De acordo com o levantamento, 1,1 milhão de estudantes brasileiros com 15 anos não têm capacidades elementares para compreender o que leem, nem conhecimentos essenciais de matemática e ciências. Dos 2,7 milhões de alunos de 15 anos avaliados no Brasil, 1,9 milhão tinham dificuldades em matemática básica, 1,4 milhão em leitura e 1,5 milhão em ciências.

Espera-se, portanto, que o Ministério da Educação entenda, de modo definitivo, o significado do verbo compartilhar. É preciso aprender com todos para ensinar melhor.

*Rubens F. Passos, economista pela FAAP e MBA pela Duke University, é presidente da Associação Brasileira dos Fabricantes e Importadores de Artigos Escolares

Natural do Rio de Janeiro, é jornalista formado pela Favip. Desde 1990 é repórter do Jornal VANGUARDA, onde atua na editoria de política. Já foi correspondente do Jornal do Commercio, Jornal do Brasil, Folha de S. Paulo e Portal Terra.

One thought on “Compartilhar, um verbo que o MEC não conjuga

  1. Geyson Magno says:

    O que o MEC pretende é desmantelar o ensino público, em todas as esferas. As boas experiências estão na rua, no chão da escola, como bem disse o articulista, são conhecidas, no entanto, muito poucas vezes mostrada na grande midia, que defende, sistematicamente esse projeto, achincalhando a escola, os alunos e a população escolar como um todo.
    Esse discurso leva boa parte da população a repetir que a educação pública não presta.
    Sou contra esse discurso. A educação pública no Brasil poderia ser melhor, mas, ela está no mesmo nível que 90% das escolas privadas do país.

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