Oito de cada dez trabalhadores brasileiros correm o risco de perder o emprego ou parte da renda por causa do impacto da epidemia do coronavírus na atividade econômica, segundo um novo estudo realizado por um grupo de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP).
A análise do grupo indica que mesmo trabalhadores com vínculo formal, e que atuam em atividades consideradas essenciais que podem continuar sendo exercidas apesar das medidas de isolamento impostas pelas autoridades para conter a transmissão do vírus, tornaram-se vulneráveis diante da crise.
Segundo os cálculos dos pesquisadores, o grupo mais frágil reúne cerca de um quarto da força de trabalho, ou 24 milhões de pessoas. São em geral informais empregados em atividades não essenciais e que, portanto, foram mais afetados pela paralisia da economia na quarentena.
Outro grupo, correspondente a 55% do pessoal ocupado, e que reúne 52 milhões de trabalhadores, se mostra vulnerável apesar de ter vínculo formal, ou mesmo trabalhando em atividades consideradas essenciais, segundo o estudo. Juntos, os grupos representam 81% da força de trabalho.
“Pessoas que teriam melhores condições de enfrentar crises econômicas no passado estão desprotegidas diante da epidemia”, diz o sociólogo Rogério Barbosa, um dos coordenadores do grupo, parte de uma rede multidisciplinar que começou a estudar o impacto das políticas de combate ao coronavírus.
Para avaliar o grau de vulnerabilidade da força de trabalho, o estudo analisou sua composição antes da epidemia, de acordo com o vínculo com o empregador e o setor de atividade, conforme os últimos dados publicados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), referentes a dezembro.
Informações do Google sobre a mobilidade nas grandes cidades, dados da Cielo sobre transações com cartões de crédito e pesquisas do Sebrae foram usados para avaliar os efeitos da epidemia nos diferentes setores de atividade econômica.
Entre os trabalhadores ameaçados mesmo com vínculo formal em atividades essenciais estão funcionários de bares, restaurantes e comércio de alimentos, que, embora continuem trabalhando, foram afetados pela queda de movimento provocada pelas políticas de isolamento social adotadas pelos estados.
O governo lançou nas últimas semanas várias medidas desenhadas com o objetivo de proteger a renda dos mais vulneráveis e preservar empregos, incluindo um auxílio emergencial de R$ 600 para trabalhadores do setor informal e compensações para os que tiverem redução de jornada e salário no setor formal.
Muitos trabalhadores que perderam renda abruptamente por causa da paralisia de suas atividades levarão mais tempo para conseguir o auxílio emergencial porque não faziam parte do cadastro dos programas sociais do governo antes da epidemia e entrarão depois na fila dos benefícios.
O grupo da USP pretende examinar nas próximas semanas o impacto da crise econômica sobre as famílias. O pressuposto é que famílias mais numerosas com vários integrantes entre os grupos vulneráveis sofrerão mais durante o período de isolamento e deveriam receber maior atenção das autoridades.
Nas famílias mais pobres, no máximo duas pessoas em cada domicílio podem receber o auxílio emergencial. Mulheres solteiras que são as principais responsáveis pelo sustento de suas famílias têm direito a R$ 1.200 se preencherem os requisitos do programa.
Os pesquisadores da USP incluíram entre os grupos mais frágeis microempreendedores e funcionários de empresas com menos de cinco trabalhadores, que reuniam metade da força de trabalho ocupada antes da crise.
“Muitas dessas empresas não conseguirão sobreviver e preservar os empregos dessas pessoas se não tiverem acesso a crédito durante a crise”, diz Barbosa. “Isso significa que as políticas de garantia da renda desses trabalhadores podem se revelar insuficientes depois que o pior da crise passar.”
Folhapress