Em reunião virtual com o presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), ministro Luís Roberto Barroso, dirigentes dos partidos políticos fizeram críticas à corte eleitoral e afirmaram ser “inexequível” a aplicação da cota financeira para negros já em 2020.
Barroso, por sua vez, admitiu a falta de regulamentação sobre a forma da divisão dos recursos de acordo com a raça, mas disse que o caso agora está nas mãos do ministro Ricardo Lewandowski, do STF (Supremo Tribunal Federal).
O presidente do TSE pediu para as siglas cumprirem de boa fé a determinação judicial e reconheceu que o calendário para as legendas esclarecerem dúvidas está apertado.
“Vou me empenhar para fazer a interlocução com meus colegas de TSE e com o ministro Ricardo Lewandowski para, no menor tempo razoável, podermos orientar. A pior coisa é a gente querer fazer coisa certa e não saber como”, admitiu.
O TSE havia decidido que a implantação da medida se daria só em 2022, mas em liminar o Lewandowski determinou a aplicação já em 2020. O plenário da corte tende a confirmar a medida, mas o caso está na pauta da sessão virtual que começa em 26 de setembro e só acaba em 2 de outubro, quando as campanhas já tiverem começado.
Os mais incisivos contra a adoção imediata da cota e contra decisões das cortes superiores que legislam no lugar do Congresso foram os presidentes do PSB, Carlos Siqueira, do Cidadania, Roberto Freire, e o senador Marcelo Alencar (PI), que representava o MDB no encontro.
Além de dizer ser inexequível a adoção das cotas eleitorais raciais já em 2020, Castro criticou ainda as decisões do tribunal de determinaram, em anos anteriores a cota de 30% para as mulheres, afirmando que, com isso, dirigentes partidários vêm sendo acusados de lançar candidaturas laranjas porque não conseguem achar mulheres que queiram se candidatar e que obtenham votos.
“Se formos aplicar agora essa cota para os negros, vai ser um transtorno muito grande, isso é absolutamente inexequível, vai ser uma dor de cabeça monstruosa para os dirigentes partidários”, disse Castro, lembrando que os critérios de divisão das verbas eleitorais públicas já foram definidos pelos partidos.
Siqueira e Cidadania criticaram o que classificaram como “tutela” do TSE sobre os partidos. “A maioria dos partidos sequer tem tribunal [eleitoral], que dirá tutela sobre os partidos”, disse Siqueira, acrescentando que “essa fúria legiferante dos tribunais precisa ser contida”.
“Sou de acordo com os 30% [para mulheres], sou de acordo com a cota, mas quem tem competência para fazer isso são as duas Casas do Congresso Nacional”, disse Siqueira, lembrando da regra que mudanças eleitorais têm que ser feitas com um ano de antecedência.
Em resposta às críticas, Barroso disse reconhecer o impacto da decisão e a dificuldade, mas que agora a palavra final está com o STF. “O que posso sugerir é que, de boa fé, tente se cumprir a decisão”, afirmou Barroso em determinado ponto da reunião.
Em resposta a Siqueira, porém, o ministro foi mais incisivo e defendeu as decisões dos tribunais superiores em defesa de minorias. “Esse é um debate mundial, que é essa fronteira que separa a interpretação constitucional das decisões políticas”, disse Barroso.
E prosseguiu com a resposta: “A posição que o senhor defende, talvez o senhor se sinta um pouco constrangido de saber, é a posição do partido Republicano nos Estados Unidos, a de que por interpretação constitucional você não possa proteger as minorias”.
Barroso defendeu que o cálculo para aplicação da cota deve levar em consideração, primeiro, a questão de gênero para, depois, aplicar a cota dentro da proporção de candidatos de cada sexo.
“Se prevalecer decisão do ministro Lewandowski, ele que deverá esclarecer o critério, mas esse é o que me parece o razoável”, disse.
Ele reconheceu que o calendário está apertado e prometeu articular com Lewandowski para acelerar uma definição ao caso. “Está no plenário virtual, nem foi confirmada ainda. O timming está apertado. Mas acho que em linha de princípio a lógica que falei, mas isso é posição minha, não é posição institucional”.
Barroso afirmou se alinhar a posição diversa, de que as cortes constitucionais devem se conter em questões econômicas e administrativas, mas não sobre direitos das minorias.
“Quando se trata de proteger negros, gays, mulheres, transgêneros, você não pode depender inteiramente do processo político majoritário, porque compreensivelmente as maiorias não tendem a proteger as minorias”, afirmou.
Ele ressaltou que a população de pardos e pretos é majoritária no país, mas na própria reunião havia apenas um ou dois negros. “Se nós dependermos das maiorias para proteção das minorias o status quo nunca é rompido”, acrescentou.
E finalizou: “A escravidão foi abolida em 1888 e até hoje nós temos uma sub-representação das pessoas negras em todos os segmentos da vida pública e privada. Então eu perguntaria ao senhor quanto tempo mais nós temos que esperar que as maiores tenham a deferência de incluir os negros?”.
O presidente do PSD, Gilberto Kassab, fez uma crítica mais ampla à atuação do TSE e disse que o problema de aprovação de regras eleitorais pela corte em data próxima da eleição não é exclusividade deste episódio. “Precisa haver diálogo um pouco preliminar para que possamos não só estar nos preparado, mas também para podermos contribuir com nossas visões”, disse.
O presidente do PP, senador Ciro Nogueira, por sua vez, disse que há uma angústia muito grande dos partidos sobre a aplicação da cota financeira de negros e citou brechas na decisão que levam dirigentes partidários à indecisão.
“Isso tem nos trazido preocupação muito grande de como colocar em prática”.
Folhapress