Do Congresso em Foco
O deputado Jean Wyllys (Psol-RJ) tem recebido ameaças de morte há meses (veja mensagens abaixo). Em seu segundo mandato, ele diz haver vasto material investigativo à disposição da Polícia Federal, boa parte dele conseguido pela própria equipe de gabinete. Mas, diante do cardápio de evidências, inclusive já feita a identificação dos criminosos, a apuração não anda – e, segundo Jean, por puro menosprezo dos investigadores.
“A Polícia Federal tem se mostrado pouco sensível a essa questão. Nós temos elementos, muitos indícios, porque acompanhamos e monitoramos a origem dessas mensagens há muito tempo. E há um padrão que se repete nas ameaças, nos textos. A gente fez meio que um trabalho de investigação coletando [indícios], e entregamos isso já de mão beijada à polícia, já mastigado”, declarou o deputado, em entrevista ao Congresso em Foco.
Jean diz que a rotina e demais informações sobre seus familiares são detalhados a cada ameaça. “Entregamos nomes, porque uma das figuras passou pra gente algumas informações de que ele fazia parte dessa quadrilha, e que ele saiu dessa quadrilha. Ele mora nos Estados Unidos, hoje, e decidiu colaborar, identificando quem são as pessoas e de onde partem essas ameaças. A gente também passou isso, mas a Polícia Federal se move muito pouco. Essa é a verdade, é a sensação que eu tenho”, afirmou o deputado.
Primeiro parlamentar declaradamente homossexual a defender os direitos LGBT no Congresso, Jean evita afirmar de maneira convicta que a PF tem agido de forma homofóbica. No entanto, ele lembra que, quando os alvos de crimes cibernéticos são atores e atrizes famosos, por exemplo, verifica-se uma pronta ação dos investigadores, com muitos dos casos rapidamente resolvidos, com os criminosos devidamente identificados, e depois prontamente remetidos à Justiça.
“Não sei lhe dizer se [agem] de maneira homofóbica. O que eu quero lhe dizer é que não há sensibilidade para resolver essa questão. A Polícia Federal é uma instituição que tem agido de maneira muito pouco republicana nos últimos tempos. Não por acaso, há um pedido de investigação para entender porque a PF cedeu agentes, helicópteros, armas para a realização de um filme sobre a Lava Jato, cujo patrocinador é uma incógnita, é anônimo”, completou o deputado.
A reportagem procurou a PF para comentar o assunto. Em um primeiro contato, a assessoria de comunicação pediu a formalização da demanda por e-mail. E que, se fosse o caso, a resposta seria encaminhada ao site, o que ainda não aconteceu.
Fla x Flu político
Para Jean, talvez a PF esteja a agir de acordo com a coloração ideológica das vítimas ou investigados, agora que não está mais sob o comando do Partido dos Trabalhadores. Ele diz acreditar que, talvez por ser um parlamentar de oposição ao governo Michel Temer, não tem sido tratado de maneira adequada pela PF.
“A Polícia Federal tem conduzido coercitivamente blogueiros de esquerda. E tem vazado, ao mesmo tempo, informações para jornalistas favoráveis ao governo Michel Temer e ao impeachment da Dilma. Eu sou um cara que tem um posicionamento político claro, sou de um partido de esquerda, socialista. Fui contrário, votei contra o impeachment da Dilma. Sou oposição ao governo ilegítimo e golpista de Michel Temer, que quer empreender uma série de reformas que prejudicam os trabalhadores. Ou seja, esse posicionamento talvez contamine a Polícia Federal na leitura que ela faz das ameaças. Talvez, no fundo, ela concorde”, acusa o parlamentar fluminense.
O deputado relata ainda que, na mais recente declaração à imprensa sobre as ameaças, os criminosos disseram algo ainda mais grave do que o alegado menosprezo da PF. “A gente recebeu dos ameaçadores o seguinte texto: ‘Você está pensando o quê? Vai envolver a PF nessa história por quê? Quem você acha que me dá as informações acerca da sua vida e da vida dos seus irmãos e sua mãe?’”, declarou.
“O texto diz exatamente isso, que pessoas da própria Polícia Federal estão colaborando com eles nas informações”, arrematou Jean, lembrando ter levado a denúncia ao diretor-geral da PF, Leandro Daiello Coimbra.
Vice-líder do Psol na Câmara, Chico Alencar (RJ) tem se manifestado sobre as ameaças contra Jean Wyllys. Ele articula uma reunião da bancada do Psol, que tem seis deputados, com o ministro da Justiça, Osmar Serraglio, peemedebista e aliado de Temer. O objetivo é fazer com que a pasta, à qual a PF é subordinada, ajude a localizar os criminosos e proteja Jean adequadamente.
Imprensa na mira
Jean Wyllys diz que cópias das ameaças foram remetidas à sua mãe e aos seus irmãos. Ele relatou à reportagem que, depois de publicadas reportagens e iniciada a investigação, os criminosos voltaram a entrar em contato com o gabinete e ameaçaram “desmembrar minha mãe, despedaçá-la e mandar os pedaços para mim”. O deputado disse ainda que até uma jornalista da TV Câmara, que veiculou matérias sobre o assunto, foi ameaçada de morte. A profissional de imprensa pediu licença da Casa.
“Ela recebeu uma comida em casa. Eles mandaram comida para ela, para deixar claro que sabiam o endereço dela. Ameaças com o mesmo conteúdo, dizendo que iam matar o filho dela. Ela ficou apavorada. Imediatamente, o diretor da Câmara acionou o presidente [Rodrigo Maia, DEM-RJ] e a Polícia Federal foi acionada, como sempre”, acrescentou.
Também jornalista, Jean diz ainda que a Polícia Legislativa da Câmara tem ajudado na rede de proteção que foi feita em torno do deputado. Já a Polícia Militar, informa o deputado, tem feito a guarda da sua família – nesse caso, por iniciativa do próprio parlamentar. “Nós decidimos nos proteger. Eu comuniquei ao secretário de Segurança Pública [Maurício Teles Barbosa] e ao governador do estado da Bahia [Rui Costa] sobre as ameaças. A Câmara tomou a iniciativa de proteger a mim, como parlamentar, que é o que ela pode fazer”, explicou, lembrando que está entre as atribuições da PF a proteção de parlamentares, bem como a própria investigação sobre mandatários.
Entre as ameaças, conta Jean, há a exigência de que ele renuncie ao mandato – algo que ele descarta. Em uma das mensagens enviadas ao parlamentar há uma que fez justamente essa ameaça, e que uma escola seria explodida caso a demanda não fosse atendida. Tudo foi devidamente comunicado à PF, ele ressalta.
O deputado lembra ainda que seus algozes chegaram a ser presos, em 2012, durante a Operação Intolerância, da mesma PF. Com inspiração neonazista, o grupo foi autuado por participação em páginas na internet que praticam apologia à violência contra a mulher, à pedofilia e ao racismo, entre outros crimes.
“Não creio que eles vão praticar o ato, mas há loucos que praticam, né? Em 2011, o psicótico que matou duas meninas em Realengo [RJ], na Escola Tasso da Silveira, frequentava a página de Sílvio Koerich, que ameaçava a mim e a [blogueira feminista] Lola Aronovich, professora da Universidade Federal do Ceará. Eles promoviam pedofilia na página, ameaçavam negros e nordestinos. Ou seja, o cara frequentava essa página, que alimentava ódio às mulheres, uma página misógina, homofóbica, racista e o cara que frequentava essa página fez um curso de tiro na internet. E, depois, comprou uma arma e matou duas meninas em Realengo”, destacou, referindo-se a uma das diversas páginas neonazistas que estão ativas na internet.
Ataque químico
O Congresso em Foco teve acesso a três das inúmeras ameaças feitas ao deputado. Por motivo de sigilo, e até para não atrapalhar as investigações, os destinatários foram omitidos. A maioria dos textos é endereçada aos e-mails do parlamentar, por meio de contas criadas apenas com esse propósito.
Em uma das mensagens, o criminoso diz que, caso nem Jean nem o senador Magno Malta (PR-ES) renunciem aos respectivos mandatos, ataques com grandes quantidades de produtos químicos letais seriam feitos em escolas, hospitais e universidades. O curioso é que Malta – evangélico e membro da da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Família e Apoio à Vida – tem ideologia e atuação parlamentar diametralmente opostas à de Jean.
As ameaças:
“Se o deputado federal Jean Wyllys e o senador Magno Malta não renunciarem, eu vou espalhar 500 quilos do explosivo triperóxido de triacetona – explosivo tão perigoso e potente que é chamado de ‘Mãe de Satan’ pelos terroristas do Estado Islâmico – em escolas, hospitais e universidades brasileiras.”
“Eu mesmo poderia matar esses desgraçados e depois meter uma bala na minha cabeça. Porém, a morte seria pouca [sic] para eles. Eu quero ver eles e a família deles sofrendo.”
“Se vocês conseguirem me identificar e vierem atrás de mim, vão ter uma grande surpresa!!! Vou gritar ‘Allahu Akbar’ e me explodir em uma bola de fogo levando boa parte do meu prédio, matando dezenas de inocentes!”