O país atravessa, há mais de dois anos, uma das piores crises de sua história e esse cenário econômico conturbado tem provocado um encolhimento significativo no mercado de trabalho formal. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (Pnade Contínua), divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontam mais de 12 milhões de desempregados em 2016 – número recorde desde o início do estudo, em 2012. Especialistas estimam uma recuperação lenta para economia nacional e as projeções desse ano ainda apontam retração e aumento do desemprego antes do país conseguir alcançar um cenário de estabilidade.
Enquanto isso, os programas de estágio e aprendizagem apresentam índices positivos no número de contratações, despertando o interesse daqueles que ainda frequentam as salas de aulas, especialmente os jovens – entre 14 e 24 anos – que figuram na faixa etária mais afetada pelos percalços da economia brasileira. Ao contrário do mercado celetista as vagas de estágio seguem estáveis e com boas projeções mesmo em meio ao quadro econômico desfavorável, o que tem atraído cada vez mais estudantes e tornado a disputa bem acirrada.
Panorama do estágio
De acordo com o último levantamento realizado pela Associação Brasileira de Estágios (Abres), atualmente há mais de um milhão de estagiários no país – cerca de 740 mil estudantes de graduação e 260 mil alunos dos ensinos médio e técnico. A Abres ainda prevê a abertura de 210 mil oportunidades no primeiro trimestre deste ano em todo o país, entre novos contratos e renovações de acordos antigos.
Para Rafael Pinheiro, gerente de Recursos Humanos, algumas empresas diminuíram os programas de estágio nesse período de crise, porém, segundo o especialista, muitas outras organizações aproveitaram o momento para investir no treinamento de uma mão de obra qualificada que poderá render mais resultados após a recuperação do mercado.
Pinheiro afirma que: “o estagiário é um funcionário em potencial que pode ser treinado de acordo com a cultura organizacional para compor futuramente o quadro de funcionários. Além disso, nesse momento em que a economia do país amarga números negativos no mercado de trabalho formal, implementar um programa de estágios representa uma redução de custos significativa para as empresas”.
Recorde de inscritos
De acordo com Tiago Mavichian, diretor da Companhia de Estágios – assessoria especializada no recrutamento e seleção de estagiários – 2016 bateu recorde de inscrições no segundo semestre do ano – mais de 105 mil estudantes em buscas de uma oportunidade de estágio. Dados da recrutadora apontam um crescimento de 7% em relação ao mesmo período do ano anterior. Para o especialista a expectativa é de que o número de candidatos continue subindo neste ano: “Com o desemprego acentuado entre os jovens, os programas de estágio surgem como alternativa para não ficar à margem do mercado de trabalho. É uma forma que o estudante encontra para complementar a renda e ainda adquirir experiência no mercado”.
Segundo Mavichian o programa de estágio tem cunho educativo, mas une também o lado profissional, possibilitando que o estudante coloque em prática todo o conhecimento teórico adquirido em seu curso e atue diretamente em sua área de formação. “O estágio se destaca entre os jovens não apenas pelos números expressivos que vem apresentando, mas também pela estrutura que possui, voltada para adequar da melhor forma a rotina de um estudante à vivencia profissional, oferecendo uma carga horaria reduzida, flexibilidade de horários e facilitando a inserção daqueles que não possuem uma experiência anterior” – explica o especialista.
Mudança de perfil
Desde a regulamentação da Lei do estágio (nº 11.788), em 2008, houve um amadurecimento tanto no perfil do candidato quanto no perfil da concedente. “O que antes, por muitas vezes, era visto como um meio de conseguir uma fonte de renda para o estudante ou apenas reduzir os encargos trabalhistas da empresa, hoje, já é encarado de outra forma e com a seriedade que merece” – explica o gerente de Recursos Humanos.
Pinheiro afirma que, atualmente, as organizações implementam os programas de estágio em vista do conjunto de benefícios que eles proporcionam: “A redução de custos é um bônus imediato, mas há vantagens a médio e longo prazo que fazem do estágio um investimento promissor para a organização, que vai dispor de um colaborador em constante formação e com nova visão de mercado”.
Em contrapartida o estagiário, que antigamente tinha a fama de ser aquele que levava o cafezinho para o chefe e desempenhava as mais diversas funções dentro da empresa, hoje em dia tem a garantia de atuar em contato direto com sua área de formação, desenvolver atividades condizentes com seu ramo no mercado e adquirir experiência profissional, com férias, remuneração e flexibilidade, o que torna as vagas de estágio cada vez mais cobiçadas pelos estudantes.
Processo mais rigoroso
Com o aumento exponencial no número de candidatos as disputas para as vagas de estágio estão mais acirradas, com isso, o processo seletivo de muitas empresas passa a ser mais rigoroso, a fim de filtrar e extrair os perfis mais adequados às vagas disponíveis. O início do ano é uma época de alta temporada em relação a abertura de novas oportunidades. Muitas empresas abrem novas vagas ou precisam renovar seu quadro de estagiários devido ao termino de contratos ou efetivação dos colaboradores, mas com a alta oferta de candidatos a seleção passa a ser mais criteriosa e é preciso se preparar para garantir uma vaga.
Maior qualificação
Para se destacar diante da grande concorrência é necessário investir em qualificação, especialmente nesse período de crise. Apesar da experiência prévia na área não ser uma das exigências para o desempenho do estágio, conhecimento nunca é demais, e não precisa vir necessariamente de uma função anterior, há várias maneiras de desenvolver e aprimorar as competências individuais para se tornar apto a determinadas atividades.
Segundo Pinheiro os cursos de idiomas são um grande diferencial no currículo, assim como trabalhos voluntários e estágios de férias, mesmo aqueles não remunerados, podem ajudar a enriquecer o portfólio de quem está em busca de uma oportunidade, especialmente se for o primeiro emprego: “muitas vezes um currículo com cursos e formação complementar pode ser mais interessante do que aquele que possui uma experiência anterior mas não buscou uma especialização ou alguma forma de se atualizar na área”.
Carreiras promissoras
Administração está no topo da lista entre as áreas que mais estão contratando mesmo nesse período de crise, contabilidade e TI vêm em segundo lugar, seguidas respectivamente por economia, engenharias e direito. “Apesar da fama de saturação que algumas carreiras ganharam ao longo do tempo devido à grande procura nos cursos de tecnólogo e graduação, elas ainda possuem muito campo para ser explorado e por isso o número de vagas tende a ser maior, pois a formação em determinado curso, como administração por exemplo, permite várias possibilidades de atuação no mercado” – finaliza o gerente de Recursos Humanos.