Mesmo com desemprego e inflação em alta, trabalhador paga cada vez mais imposto

Mesmo com o desemprego elevado e com a inflação em dois dígitos corroendo o poder de compra da população, o governo não deixa de aumentar o peso dos tributos sobre os ombros dos trabalhadores. Aqueles que recebem a mordida do Leão diretamente na fonte pagam cada vez mais imposto. Para se ter uma ideia, a receita do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sobre os rendimentos do trabalho — que são descontados mensalmente do contracheque dos empregados com carteira assinada — somou R$ 119,6 bilhões de janeiro a outubro. O montante é 13,56% superior, em termos nominais, ao volume arrecadado no mesmo período de 2020, de R$ 105,3 bilhões — dado bastante próximo dos R$ 104,6 bilhões recolhidos nos 10 meses de 2019. Pelos cálculos da Receita, em termos reais (descontada a inflação), o aumento da arrecadação desse tributo foi de 5,44% no mesmo período.

Conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a inflação oficial de janeiro a outubro deste ano, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), foi de 8,24%. No acumulado em 12 meses até novembro, o IPCA saltou 10,74%. Por conta do dragão inflacionário que pressiona os preços dos produtos consumidos pelos brasileiros, a arrecadação total do governo neste ano com impostos disparou.

De janeiro a outubro, o governo arrecadou R$ 1,527 trilhão com tributos, com alta de 29% em relação ao mesmo período de 2020, em termos nominais. O ministro da Economia, Paulo Guedes, não para de comemorar que, neste ano, “o governo deverá arrecadar quase R$ 2 trilhões em impostos”, um recorde histórico.

Procurada, a Receita Federal informa, por meio de nota, que o crescimento do imposto retido na fonte dos trabalhadores “está perfeitamente em linha com os aumentos verificados no trabalho assalariado e no Participação nos Lucros ou Resultados (PLR) e que ainda que não significativos em termos absolutos”.

O órgão reforça que o aumento das receitas “reflete o acréscimo real na arrecadação dos itens Rendimentos do Trabalho Assalariado ( 5,24%), Aposentadoria do Regime Geral ou do Servidor Público”( 2,06 %) e na Participação nos Lucros ou Resultados — PLR ( 15,18%)” e destaca que o emprego formal vem crescendo neste ano, o que tem ajudado, também, o aumento da arrecadação.

O desemprego não está aumentando. Houve a criação de 3 milhões de novos empregos formais, de acordo com o Caged. Portanto, a arrecadação segue em linha com a criação de empregos”, destaca o Fisco, citando os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados do Ministério do Trabalho e Previdência, que revisou recentemente a série.

Na avaliação de especialistas ouvidos pelo Correio, o principal motivo do aumento da arrecadação do IR retido na fonte dos trabalhadores brasileiros é a falta de correção da tabela do Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF). Mas, como o governo não conseguiu aprovar a proposta de reforma do IR enviada ao Congresso, a tabela continuará sem correção pelo sétimo ano consecutivo. O último ajuste ocorreu no governo Dilma Roussef (PT), em 2015.

Pelos cálculos da Unafisco Nacional, por conta desse congelamento, a defasagem histórica da tabela do IRPF chega a 134,72%, considerando o imposto que os brasileiros pagarão na fonte em 2022, que constarão da declaração de 2023. Com isso, R$ 149,3 bilhões é a diferença a mais na arrecadação anual do governo por conta dessa defasagem. Ou seja, os trabalhadores pagam a mais, em imposto, recursos suficientes para custear mais do que quatro Bolsas Famílias antigos, programa que era estimado em torno de R$ 35 bilhões para o Orçamento de 2022.

Congelamento
“A principal razão desse aumento da arrecadação dos rendimentos do trabalho é o congelamento da tabela em um ano em que a inflação ficou muito alta e passou de 10%. Outro motivo é que, no ano passado, por conta da pandemia, houve redução de salários e de jornada dos trabalhadores em várias empresas, e isso pode ter ajudado a reduzir o volume do imposto retido na fonte”, afirma o especialista em direito tributário Ilan Gorin, diretor da Gorin Advocacia.

Na campanha eleitoral, o presidente Jair Bolsonaro (PL) prometeu corrigir a tabela do IR, mas encerrará o mandato sem cumprir a promessa. Na proposta de reforma enviada do Executivo, o limite de isenção da tabela passaria de R$ 1,9 mil para R$ 2,5 mil, menos da metade do que Bolsonaro prometeu quando pedia voto aos trabalhadores: conceder isenção para quem ganhasse até cinco salários mínimos (R$ 5.500 atualmente).

Correio Braziliense

Pedro Augusto é jornalista e repórter do Jornal VANGUARDA.

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