A pressão aumentou nesta terça-feira (30), no Reino Unido, para que o Executivo de Boris Johnson aja ante as denúncias de uma “cultura do estupro” generalizada no sistema educacional, alimentadas pela publicação de milhares de relatos chocantes postados on-line.
Do líder da oposição trabalhista, Keir Starmer, ao secretário-geral do sindicato dos diretores de escolas NAHT, Paul Whiteman, multiplicaram-se as vozes pedindo ao governo que responda a essa avalanche de denúncias, em sua maioria anônimas, de mais de 10 mil garotas.
Estas adolescentes, que falam de mãos colocadas sob suas saias, felações forçadas, ou a difusão de fotos e vídeos íntimos por parte de colegas masculinos em escolas – dos ensinos médio e superior, públicas e privadas – aparecem na rede “Everyone’s Invited” (“Todo mundo está convidado”, em tradução livre), criado no verão passado por Sara Soma, de 22 anos.
Seu número disparou após o assassinato, no início de março, de Sarah Everard, uma londrina de 33 anos que desapareceu quando voltava para casa à noite. O crime chocou o país e deflagrou um debate nacional sobre a segurança das mulheres.
“Pelos testemunhos recebidos em ‘Everyone’s Invited’ fica claro que a cultura do estupro é endêmica” em “todas as partes da sociedade, incluindo todas as universidades e todas as escolas”, escreveu Soma no jornal “The Times”.
“Esperemos que isso produza um efeito de bola de neve e se compreenda melhor e se erradique a cultura do estupro”, acrescentou.
No sábado passado, a polícia londrina anunciou ter aberto uma investigação sobre esses depoimentos, que incluem algumas das mais prestigiosas escolas particulares do país, como a escola de elite Eton College.
Em um comunicado, a Scotland Yard anunciou ter “examinado o conteúdo” do site para “estimular” as vítimas a agirem legalmente e que, “como resultado, recebeu várias denúncias sobre crimes específicos”.
Agir imediatamente
“Celebramos qualquer iniciativa que estimule as vítimas de crimes sexuais a falar e a buscar apoio”, disse a comissária Mel Laremore, encarregada de investigar estupro e crimes sexuais. “Levamos muito a sério as acusações de agressão sexual”, acrescentou.
Classificando o número de depoimentos como “muito preocupante”, a policial garantiu que se entrou em contato com as escolas identificadas para oferecer “apoio especializado” às vítimas e pedir aos pais de alunos que denunciem, caso seus filhos tenham participado dos abusos.
O ministro da Educação, Gavin Williamson, garantiu que o governo tomará “as medidas cabíveis”. “Uma escola – seja independente, ou pública – nunca deve ser um ambiente, onde os jovens se sintam inseguros, e muito menos um lugar onde abusos sexuais possam acontecer”, tuitou.
Para o Partido Trabalhista, porém, principal força de oposição, isso não é suficiente e é preciso agir já. “Tem que haver uma investigação e tem que ser lançada muito rápido, isso é grave”, declarou Starmer.
“Precisamos nos perguntar o que mais todos podemos fazer para prevenir o assédio e a violência sexual”, disse Whiteman, do NAHT. “Não há dúvida de que as escolas podem e devem desempenhar um papel-chave neste trabalho, mas se trata de um problema que vai muito além dos portões das escolas”, acrescentou.
Dentro do Partido Conservador, de Johnson, a congressista Maria Miller, que supervisionou em 2016 a elaboração de relatório sobre o tema, lamentou que tão pouco tenha mudado passados cinco anos desde a publicação de suas conclusões.
Ela insistiu em que o regulador das escolas britânicas, o Ofsted, agora tem a obrigação de supervisionar as denúncias de agressão sexual e as medidas adotadas em resposta. E pediu monitore e comprove se estão sendo realmente postas em prática.
AFP