Brazilian President Jair Bolsonaro speaks during a press conferece at the Vila Nova Star Hospital in Sao Paulo, Brazil, on July 18, 2021. – Bolsonaro received his medical discharge this Sunday, July 18, after being treated for four days for an intestinal obstruction in a hospital in Sao Paulo. (Photo by Miguel SCHINCARIOL / AFP)
A crise do governo de Jair Bolsonaro, que na semana que passou deu um cavalo de pau na composição política do Planalto, acentuou as composições do presidente e de seus rivais visando as eleições de 2022.
O presidente, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), João Doria (PSDB), Eduardo Leite (PSDB) e José Luiz Datena (PSL) se movimentam de olho no novo cenário pela deterioração da posição de Bolsonaro. Até Sergio Moro reapareceu em conversas sobre o ano que vem.
O presidente experimentou um tombo em pesquisas no primeiro semestre na esteira da crise da pandemia e da associação de seu governo com acusações de corrupção feitas na CPI da Covid.
Houve ainda os entrechoques institucionais promovidos por Bolsonaro, que colocou a pauta da adoção do voto auditável por impressão como cavalo de uma batalha perdida e resolveu sugerir risco para a eleição em si.
Para temperar, a presença do fantasma militar com a polêmica da defesa do voto impresso pelo ministro da Defesa, Walter Braga Netto.
Tudo isso aumentou a instabilidade no Planalto e fez com que Bolsonaro cedesse espaço ao centrão, personificado na presença de Ciro Nogueira (PP-PI) na Casa Civil.
Rasgando o que dissera de 2016 até aqui, Bolsonaro até se declarou integrante do grupo político –segredo de polichinelo, mas para quem se elegeu prometendo acabar com a “velha política”, é um golpe de imagem ainda a ser mensurado entre sua base mais fiel.
A aposta dos apoiadores do presidente é que a eleição está longe, e uma retomada econômica bombada pelo ciclo de commodities em curso e a anunciada distribuição de renda aos mais pobres, somada ao avanço da vacinação contra a Covid-19, darão uma chance de recuperação a ele.
Neste cenário, Bolsonaro se manteria como um candidato viável, acima dos 20%-25% que tem registrado de intenção de voto, barrando adversários no campo da centro-direita rumo ao segundo turno com o hoje líder Lula.
Aí, afirma um cacique do centrão, ele ser contraditório ou autoritário valeria menos.
Discorda dessa avaliação o petismo, que neste momento acredita em um Bolsonaro enfraquecido e sem discurso para 2022. A desconstrução seria mais política, independendo tanto da economia.
Com efeito, Lula tem ampliado, assim como Bolsonaro, a presença em programas de rádio no interior do Brasil. No dia 8 de agosto, deverá iniciar um giro pelo Nordeste, sua base eleitoral mais forte, no que será visto como o início formal de sua pré-campanha –que, de resto, está em curso desde sua inabilitação para concorrer em 2018.
O impeachment de Bolsonaro, que passou a ter apoio majoritário na população segundo o Datafolha, parece ter ficado mais distante com a ocupação do governo pelo centrão, provavelmente às expensas da ala militar.
Assim, Lula defenderá retoricamente o impedimento, mas sua real torcida segue sendo pela manutenção de um Bolsonaro enfraquecido até o pleito. Não por acaso, ambos os rivais adotaram discursos semelhantes em relação às opções da chamada terceira via, de desprezo que denota algum temor.
No petismo, preocupa também o que chamam de alquimia de golpe, a discussão sobre o sempresidencialismo para retirar poder do Planalto.
Em outra sinalização, um alto cacique do PT procurou na semana retrasada um tucano de alta plumagem para dizer ter certeza de que Bolsonaro tentará um golpe à la crise do Capitólio de Donald Trump, conclamando apoiadores ao conflito caso venha a perder a eleição.
Sua sugestão de pacto de não agressão com o PSDB mirando o primeiro turno, a quem considera jogador certo no xadrez, não foi levada pelo valor de face, até porque embutia a esperteza de servir ao interesse de Lula. Interlocutores do ex-presidente, contudo, disseram que essa não é a posição do chefão petista.
Além disso, o principal ator tucano, Doria, não foi sondado. Se fosse, o emissário ouviria uma negativa do governador paulista.
Se não está batendo particularmente em Lula nesses dias, o governador paulista tem um longo histórico de antipetismo e sacará essa carta na campanha, cedo ou tarde.
A posição política de Doria está robustecida, faltando neste ponto a intenção de voto. Mirando as prévias de novembro, ele tem se movimentado, passando pelo circuito de rádios do interior e TVs.
Antes de ficar no estaleiro pela reinfecção pela Covid, no qual seu bom estado virou um outdoor para a eficácia da vacina que quer usar como mote de campanha, ele vinha com agenda de visitas estaduais.
Doria também resolveu fazer o dever de casa. Para fortalecer a candidatura do vice Rodrigo Garcia (ex-DEM, agora PSDB) à sua sucessão, promoveu a filiação de quase 50 prefeitos paulistas.
O governador encurralou o tucano Geraldo Alckmin, que queria voltar ao Palácio dos Bandeirantes, ao dizer que ele fugiu das prévias estaduais. O ex-governador, que deve ir para o PSD, agora enfrenta o dilema de concorrer sem a máquina, situação na qual perdeu eleições em 2006, 2008 e 2018.
Há ainda dúvidas sobre o impacto da adesão formal do PP a Bolsonaro em algo que não é lateral, a participação da sigla na pessoa de Alexandre Baldy (Transportes Metropolitanos) no secretariado de Doria. Uma saída parece ser o cenário mais provável.
O rival de Doria nas prévias, o governador gaúcho Eduardo Leite, também tem se mexido após apresentar-se ao país quando assumiu ser gay. Em viagens que têm sido criticadas no seu estado por ocorrerem durante dias de semana, ele tem percorrido a convite pontos estratégicos.
Leite tem o apoio tácito dos outros competidores nominais das prévias, Tasso Jereissati (CE) e Arthur Virgílio (AM), mas é uma certeza no partido que a disputa será entre o gaúcho e o paulista.
Na visão do decano do tucanato, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, Doria deverá levar a melhor ao fim, embora precise polir sua inserção política.
A insistência do paulista, alvo de objeções por parte do PSDB e de alguns aliados, tem sido avaliada por caciques como um trunfo. Os outros nomes da dita terceira via estão em extinção, com exceção de Ciro Gomes (PDT), que de todo modo tem dificuldade de se posicionar num jogo em que Lula está presente.
O pedetista é muito de esquerda para ser atraente à direita, e a esquerda tem dono. Outras figuras, como o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta (DEM), carecem de musculatura nacional, e o apresentador Luciano Huck preferiu ficar com o seu novo contrato na Rede Globo.
Sem se mexer está Rodrigo Pacheco (DEM-MG, rumo ao PSD), o presidente do Senado vendido por Gilberto Kassab (PSD) como a terceira via ideal. Não se espera nada dele até a virada do ano.
Já o apresentador José Luiz Datena, recém-filiado ao PSL pelo qual Bolsonaro se elegeu, joga fechado em copas. Ele já ameaçou entrar na política diversas vezes, mas integrantes da direção de seu partido dizem que ele estará no páreo presidencial se estiver marcando dois dígitos no começo de 2022. Se não, Senado ou nada são opções.
Um ponto à parte é o ex-ministro e ex-juiz da Lava Jato Sergio Moro. Dado como carta fora do baralho, ele autorizou a volta da especulação em torno de seu nome, animado justamente pela debacle política de Bolsonaro.
Mas a avaliação consensual entre seus rivais é de que Moro, ainda uma figura popular, mas desgastado após ser rotulado de parcial no julgamento de Lula pelo Supremo Tribunal Federal, acabará sendo um participante do processo, mas não como candidato.
Folhapress