Por DANIEL FINIZOLA
Aquilo que emite luz e vibra não para de incomodar. O dia segue na velocidade que ele determina. Compromissos, mensagens de trabalho, cálculos, redes sociais e, às vezes, uma mensagem de amor. Há muito não enxergamos mais as belezas do horizonte. Meu olhar agora está sempre para baixo, escravo da luz que dita o meu comportamento e meus horários. Já não consigo parar de trabalhar. A todo tempo chegam demandas. A jornada de trabalho a cada dia fica mais extensa. O tempo do lazer aos pouco vai se exaurindo, roubado por pequenos dispositivos que geram simulacros de felicidade e prazer. O mundo das sensações, da interação corporal e vivência plena dos relacionamentos aos poucos vem sendo engolido pelas relações virtuais.
Mas que mundo é esse que estamos criando? Quais as identidades que nos compõe nesse contexto? Todos os dias novas tecnologias surgem para ser nosso mais novo desejo de consumo. Rapidamente, essas tecnologias também passam a representar inclusão, mas sem gerar transformação social ou política – na maioria dos casos. Passa a ser emissora de desejos, vaidades, narcisismo. Passamos a disputar com a sociedade virtual um sinal de positivo, que aumenta a sensação de aceitação e nos torna vivos no mundo conectado.
Tudo fica rápido, dinâmico, veloz. Pode mudar a qualquer momento. Basta um toque no teclado ou uma transação bilionária para que um aplicativo que milhões de pessoas usam mude sua arquitetura informacional. Rapidamente, você terá que mudar sua lógica de raciocínio para se comunicar, não porque você quis, mas porque uma empresa determinou.
A nossa cultura e comportamento está cada fez mais refém do universo digital, que aos poucos muda nossas relações com outras pessoas e com o mundo. Estamos nos tornando pessoas naturalmente agitadas de colocações e análises superficiais, cheias de achismo. Geralmente, não estamos disponíveis nem para o debate, mas produzimos e compartilhamos imagens nas redes sociais com frases de efeito para fortalecer a nossa ideia de mundo “correto”. Criamos guetos virtuais para alimentar certezas, encontrar nossos pares e negar a alteridade.
Nesse mundo conectado, até a duração do sexo pode ser suprimida ou atrapalhada por alguma mensagem do WhatsApp. Vivemos a ditadura da conectividade ininterrupta e a reconfiguração das relações de poder. Passamos a ser uma sociedade que almeja o tempo todo o imediato em detrimento do processo, da construção, da vivência, da mediação.
Na internet todos nós somos bonzinhos, inteligentes, descolados, lindos, revolucionários capazes de mudar o mundo, ou seja, é o “show do eu” que sai em busca da aprovação dos outros avatares. Precisamos de adjetivos, mesmo que sejam simbólicos, virtuais, para suprir a falta de alegria do cotidiano. No ponto de ônibus, no almoço ou no papo com os amigos, o seu smartphone pode lhe trazer a felicidade ou uma nova meta de beleza para o dia de hoje.
Onde isso vai parar?
Até semana que vem.
@DanielFinizola, formado em ciências sociais pela Fafica, é músico, compositor e educador. Escreve todas as quartas-feiras para o blog. Site: www.danielfinizola.com.br