Preso suspeito de estuprar nove crianças em creche

A partir dos resultados e dos relatos das crianças, constatou-se que, apesar de não ter acontecido penetração e rompimento de hímen, houve a prática de atos libidinosos, como beijos forçados e toques nas regiões genitais, o que já é considerado estupro pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O ECA determina, ainda, que o endereço, nome da vítima, familiares, assim como das demais pessoas envolvidas no caso sejam preservados para que não haja exposição das crianças.

A escolinha, que não possuía registro na Secretaria de Educação da Prefeitura do Recife, funcionava no térreo de um imóvel em Santo Amaro, e as agressões aconteciam no primeiro andar, onde o abusador morava com a família. Na época, a casa, que teve as janelas quebradas pela população revoltada, foi colocada para ser alugada e a mulher, junto com as duas filhas, se mudaram temendo represálias.

Na época em que surgiram as primeiras denúncias, o delegado Ademir de Oliveira, à frente do caso, chegou a explicar que os pais que tinham filhos matriculados na escola conversaram entre si sobre o assunto e, assim, surgiram novas suspeitas. “As crianças falavam com os seus pais e diziam que ele praticava atos libidinosos numa sala, diferenciada, no primeiro andar”, disse o delegado, no início da investigação.

A Polícia Civil de Pernambuco informou por meio de nota que outros detalhes serão repassados em coletiva de imprensa a ser realizada nesta quinta-feira (25).

Em agosto do ano passado, a mãe da primeira criança vítima de violência sexual a denunciar o caso falou com exclusividade à Folha de Pernambuco sobre o drama que viveu ao lado da filha de cinco anos. Ela falou que a dona da escola, esposa do homem apontado como autor dos crimes, sabia das agressões. A identidade das vítimas e familiares foram preservados para que as crianças não sejam identificadas.

Como vocês descobriram as agressões?

Antes de sair de férias, minha filha falava sempre que não queria ir para a escola. Nós pensávamos que era manha, por ela ser a nossa mais nova e o pai ser bem grudado nela. Até que no sábado anterior à volta às aulas ela foi passar o final de semana com a avó. Lá, ela viu a avó arrumando as coisas dela para estudar e ela perguntou se teria que voltar para a escolinha. No que a avó confirmou, ela começou a explicar porque não queria voltar e relatou tudo o que ele fazia com ela.

O que ela relatou?

Ela disse que era levada para uma sala no primeiro andar, que tinha um tapete, uma TV e uma cama. Pelo que entendemos, era algo frequente, quase todo dia. Disse que lá, ele pedia para ver a calcinha dela. Ele também a colocava no colo e ficava baixando o short dela. Já na primeira vez em que isso aconteceu, ela disse que avisou a dona da escolinha e ela disse: ‘vou resolver’. A última vez, que foi antes das férias, ela disse que ele a colocou no colo com muita força e machucou, aí ela começou a chorar. A mulher dele foi lá, pegou ela e a levou de volta para a escolinha.

Como foi lidar com tudo isso?

Eu entrei em estado de choque, desmaiei, fiquei perdida. Meu marido se manteve firme e começou a agir. No sábado mesmo, minha mãe foi lá e começou a gritar, chamar ele de tarado. No outro dia eu e meu marido fomos lá, mas ele já tinha fugido. Só estava a esposa, que passou todos os dados dele para a gente entrar em contato com a polícia, mas pediu que a gente não falasse o nome da escola. No mesmo dia ele nos ligou, disse que queria se explicar antes de a gente denunciá-lo. Primeiro, ele disse que não fez nada disso. Depois, disse que a levou para essa sala porque ela estava doente, para cuidar dela. Eu confiava demais neles, nossas famílias têm certa proximidade. O irmão dela veio aqui e disse que eles tinham se separado por esse motivo. Eles moravam em outro local, perto daqui. Mas ela se mudou sozinha para cá e abriu a escola, há pouco mais de um ano. O irmão explicou que ela tinha mudado de endereço porque onde eles moravam antes tinha acontecido a mesma história e eles tiveram que sair. Depois de um tempo, ela o perdoou e eles voltaram a morar juntos.

Como tem sido desde então?

Muito difícil, mas temos conseguido. Meu marido, depois que deu andamento a tudo, desabou. Sofreu demais. No começo, a menina não dormia bem. Acordava muito de madrugada perguntando se ‘o homem ira pegar ela e sumir, que nem a polícia vai achar’. Nós achamos que ele usava isso para ameaçá-la, caso contasse algo. Por isso que ela não falou antes. Hoje ela estuda no mesmo local onde eu trabalho, para se sentir mais protegida. Já voltou a dormir bem, mas na rua não solta da minha mão e não olha para a rua onde está a escolinha. Também não sai mais pra brincar, só se eu estiver presente. A psicóloga disse que foi importante a minha filha ter falado, porque ela era a única capaz, por ser mais velha. As outras crianças eram mais novas e, por isso, foi até mais grave o que ele fez com essas outras crianças, porque elas não tinham como falar. São muito novinhas.

Cuidados

O psicólogo João Villacorta atende e coordena, há 10 anos, o Centro de Referência para o Cuidado de Crianças, Adolescentes e suas Famílias em situação de Violência (Cerca), um serviço que funciona dentro do Lessa de Andrade, oferecido pela Secretaria de Saúde da Prefeitura do Recife. “A melhor forma de os pais perceberem alguma coisa é estar sempre perto dos seus filhos, conversando, estabelecendo relações francas. Não é algo fácil, principalmente porque muitos desses abusos são praticados por pessoas do ciclo de confiança da criança. Mas com certeza é o melhor”.

Folhape

Pedro Augusto é jornalista e repórter do Jornal VANGUARDA.

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