O PT reagiu ao artigo assinado pelo ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, na edição deste domingo do Globo. O texto trouxe duras críticas às gestões anteriores dos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff e adotou tom de alerta sobre o que seria um eventual próximo governo petista.
Para especialistas, Nogueira estabeleceu as linhas da argumentação que será usada pelos aliados de Jair Bolsonaro durante a campanha à Presidência.
O partido concentrou sua resposta na presidente, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), que chamou o artigo de “mentiroso” e sustentou que é uma narrativa “terrorista do governo do terror”.
“Estão querendo responder ao Lula, candidato que tem colocado a discussão sobre os problemas do povo. Não concordamos com o modelo neoliberal que implantaram e está destruindo o país”, disse a presidente do PT, acrescentando que o ministro precisa explicar o orçamento secreto que ele teria coordenado no governo Bolsonaro.
Sobre a acusação de que um governo petista iria guinar o país para o rumo da Venezuela ou da Bolívia, Gleisi afirmou que se trata de discurso usado desde o nascimento do PT.
“Governamos por 13 anos e tivemos nosso modelo de desenvolvimento. Se era para guinar, já teríamos feito. É desespero de quem não tem argumentos para combater o que falamos.”
“O preço do combustível não tem a ver com a pandemia, mas com a expropriação da Petrobras em favor dos estrangeiros, que gerou política de preços absurda.”
No campo econômico, amplamente explorado pelo ministro de Bolsonaro, Gleisi argumenta que Lula sempre teve responsabilidade e aposta em Estado forte, com investimento para gerar emprego e sem tirar direitos trabalhistas.
Os argumentos de Ciro Nogueira foram defendidos por aliados nos bastidores. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), tem dito a interlocutores que a pauta econômica será essencial para buscar eleitores no Nordeste, onde Bolsonaro sofre com alta rejeição.
Parlamentares do Centrão afirmaram que um dos eixos da estratégia neste ano será disseminar um sentimento de medo com o possível retorno do PT ao Planalto. Por isso, será repetida com exaustão a defesa da responsabilidade fiscal.
Essa estratégia é vista com ressalvas entre parlamentares do bloco, diante dos desgastes do atual governo. Um deputado do PP, que não quis se identificar, apontou um problema, indicado pelas pesquisas, no quadro para outubro: o medo de um novo governo Bolsonaro está se tornando maior entre o eleitorado do que o medo do PT. Nesse cenário, avalia esse parlamentar, apenas essa estratégia não seria suficiente para atrair votos em favor do atual presidente.
Entre economistas, há a opinião de que o discurso governista de equilíbrio das contas públicas pode ser neutralizado pelo desempenho do governo na gestão fiscal. Avaliam, por exemplo, fragilidade na defesa do teto de gastos, citada no artigo pelo ministro, que não lembrou, porém, de mudanças que criaram brechas significativas no ano eleitoral.
A economista Margarida Gutierrez, professora da Coppead- UFRJ, afirma que, embora o governo não tenha eliminado a regra, houve “arrombamento” do teto para permitir que se incluísse os gastos do novo benefício social do governo que substituiu o Bolsa Família, o Auxílio Brasil de R$ 400.
“A grande questão é a disciplina fiscal. Ainda não foi explicitada qual será a postura de Bolsonaro em relação ao teto. Neste ano, mudou-se a regra no meio do jogo eleitoral”, afirma.
Na quinta-feira, Bolsonaro também editou decreto transferindo o controle do orçamento para a Casa Civil, atribuição que era do Ministério da Economia.
“O problema é que as decisões fiscais são eminentemente de cunho eleitoral, que culminou na decisão de passar a aprovação de receitas pela Casa Civil”, afirma o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, que também fez ressalvas à redução dos juros e à prática da menor taxa da história recente do país, citada por Ciro. A taxa, que chegou a 2% em março de 2021, agora está fixada em 9,25% ao ano.
“Se o regime fiscal estivesse sob controle, a taxa de câmbio estaria muito mais baixa e os juros não estariam aumentando. A taxa deve voltar a 12%, com riscos para frente.”
Professor de Gestão de Políticas Públicas na Universidade de São Paulo (USP), Pablo Ortellado avalia que o artigo apresenta um esboço da estratégia argumentativa que será vista no debate eleitoral. Para ele, Ciro Nogueira tenta caracterizar a gestão petista pelo segundo mandato de Dilma, sem considerar a estabilidade econômica e redução da pobreza ocorridas no governo Lula, ao mesmo tempo que justifica as dificuldades de Bolsonaro com a pandemia.
“A gente deve esperar uma resposta invertida do petismo, de que a leitura da política econômica deve se concentrar nos anos Lula. São duas estratégias que podem pegar no eleitorado e temos de ver qual terá mais força.”