A estratégia do presidente Jair Bolsonaro e seus aliados de pautar outros temas para desviar a atenção social dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da covid-19 foi cumprida na primeira semana de volta aos trabalhos no Senado. Os membros da comissão prometem, contudo, voltar ao ritmo, aumentando a relevância dos depoimentos e redirecionando o foco às sessões.
Esta semana tem depoimento do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR). Citado pelos irmãos Miranda como sendo um dos protagonistas do suposto esquema da vacina Covaxin, o deputado negou as acusações e pressionou a CPI para convocá-lo, a fim de obter um direito de resposta.
Um novo rumo da CPI ganhará força a partir de amanhã quando as investigações miram a difusão de fake news com o intuito de promover a venda seletiva de vacinas e de remédios que incorporam o chamado kit covid.
Os depoimentos da semana começam com o presidente do Instituto Força Brasil, Helcio Bruno de Almeida. O nome entrou na lista após representantes da Davati Medical Supply, que tentaram negociar com o governo federal 400 milhões de doses da AstraZeneca sem aval da farmacêutica, mencionarem Hélio como intermediador de um encontro entre eles e o então secretário-executivo do Ministério da Saúde, coronel Elcio Franco. No depoimento do reverendo Amilton de Paula, na semana que passou, Helcio foi novamente mencionado, o que reforçou a convocação.
Autor do requerimento, o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirmou que o depoimento do religioso reforçou a atuação do Instituto Força Brasil junto ao governo federal, “na atuação para aprovação do projeto de lei que tinha sido proposto na Câmara dos Deputados e que favorecia a vacinação por parte das empresas privadas”. “Essa informação é um ponto de intersecção no caso das intermediárias”.
Randolfe alegou que o instituto é mantenedor de uma série de redes sociais propagandeadoras de fake news. Exemplificou citando a plataforma Crítica Nacional que, segundo o parlamentar, “fazia campanha contra uso de máscara, contra a vacina Pfizer, contra todas as medidas de enfrentamento à pandemia”. “Paradoxalmente, esse instituto, mesmo defendendo negacionismo, participa de reunião para fazer lobby e pressão por vacinação por parte do setor privado, por parte de um convênio que possibilitaria venda dessas vacinas pelo triplo do preço”.
As investigações em torno da motivação das fake news também devem avançar com as oitivas desta quarta-feira, quando os senadores ouvem o presidente da Vitamedic Indústria Farmacêutica, Jailton Batista. Ele irá falar sobre a venda de medicamentos incorporados no kit covid e que não possuem eficácia comprovada contra a doença, mas que foram amplamente difundidos à sociedade como remédios indicados para tal tratamento. “O representante da Vitamedic vai falar do tema da ivermectina e o aumento das vendas”, explicou o senador Humberto Costa (PT-PE). Em documento enviado à CPI, a farmacêutica revela ter aumentado a produção em quase 3 mil por cento entre 2019 e 2020. “A CPI vai continuar tentando fechar todos os pontos. Vamos avançar na questão das fake news. Aliás, já avançamos bastante porque pedimos a quebra de vários perfis importantes na última semana”, completou Humberto.
No apagar das luzes da última sessão, os senadores aprovaram requerimento de quebra de sigilo telemático do perfil Dallas Cowboy, do Twitter. Segundo o senador petista, autor do pedido, a página se vale do anonimato para atacar “a ciência para disseminar ideias falsas sobre a pandemia, inclusive sobre tratamentos sem qualquer evidência científica”. A suspeita que se quer investigar é se há relação da difusão de notícias falsas com o aumento de faturamento por parte de farmacêuticas produtoras de medicamentos incluídos no chamado kit covid.
Outras duas quebras de sigilo foram aprovadas na última sessão. Uma mira os dados telefônicos do empresário Rodolfo Fortes Neto que, segundo justificativa do requerimento, teve contato com agentes políticos e representantes do governo para a compra de vacinas. A outra quer as informações telefônicas, bancárias, telemáticas e fiscais da FIB Bank Garantia de Fianças.
O objetivo é avançar nas investigações envolvendo a Precisa Medicamentos, suspeita de irregularidades nas negociações envolvendo a Covaxin. Uma carta de fiança emitida pela FIB Bank foi apresentada pela Precisa ao governo federal e a suspeita é de irregularidade na transação, cujo valor ultrapassa os R$ 80 milhões. Ambos requerimentos são do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Também mirando a FIB Bank, foi aprovada a convocação do advogado Marcos Tolentino da Silva, apontado como um sócio oculto da empresa.
Oportunidade
Os depoimentos da semana se encerram com a presença do líder do Governo na Câmara, o deputado Ricardo Barros (PP-PR). Segundo declarações dos irmãos Miranda, seu envolvimento nas supostas irregularidades na compra da vacina Covaxin foi apontado pelo presidente Bolsonaro. Barros, que nega as acusações, pressionou a CPI para convocá-lo, a fim de obter um direito de resposta.
A expectativa, para o relator, Renan Calheiros (MDB-AL), é de que a oitiva seja uma oportunidade de esclarecimentos. “Ele está citado em muitos fatos: foi ministro, era próximo de Roberto Ferreira Dias, fez a lei que possibilitou a compra da Covaxin e, especificamente, fez a proposta de venda de vacinas para o setor privado. Essas coisas todas serão esclarecidas”.
Questionado sobre o ritmo desacelerado que a CPI desempenhou esta semana, Calheiros ressaltou que houve contribuições, mas ponderou: “Estamos retomando nossos trabalhos depois de um recesso compulsório”. Ressaltou, por outro lado, que a CPI “já tem várias digitais de muitas pessoas do governo”. E completou: “Mesmo assim, temos mais 90 dias para aprofundar a investigação e esclarecer outros rumos desse enfrentamento”.
Cronograma da semana
Amanhã (10/8)
Helcio Bruno de Almeida, presidente do Instituto Força Brasil
Quarta-feira (11/8)
Jailton Batista, presidente da Vitamedic Indústria Farmacêutica
Quinta-feira (12/8)
Ricardo Barros, deputado federal e líder do Governo na Câmara