Do Congresso em Foco
Em meio ao clima turbulento das últimas semanas, com confrontos dentro e fora do Congresso e desdobramentos da Operação Lava Jato, senadores e deputados têm pela frente uma semana com uma pauta de votações recheada de temas polêmicos e impopulares. Ao que parece, depois de uma jornada de disputas regimentais, ficará pronta para votação no plenário do Senado a proposta de emenda à Constituição (PEC 10/2013) que elimina o foro privilegiado (julgamento exclusivo em tribunais superiores) para dezenas de milhares de autoridades, mantendo o benefício apenas para os presidentes dos três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário). Depois do Senado, a PEC seguirá para a Câmara, onde enfrentará terreno acidentado.
Na próxima terça-feira (16), a matéria será submetida à última sessão de discussão na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), onde já foi aprovada e retornou ao colegiado após questão de ordem apresentada pelo senador Roberto Rocha (PSB-MA), insatisfeito porque uma emenda sua apresentada à PEC foi sumariamente rejeitada em plenário, onde já poderia ter sido votada em segundo turno (no primeiro, foi aprovada pela unanimidade de 75 senadores). O texto, de autoria de Alvaro Dias (PV-PR), é relatado por Randolfe Rodrigues (Rede-AP).
Mas o mais provável é que o texto vá à votação de plenário na próxima quarta-feira (17). Na semana passada, o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), manifestou a decisão de só submeter a PEC ao conjunto da Casa com a segurança de que a matéria, que requer quórum qualificado (49 votos a favor entre 81 possíveis) e dois turnos de deliberação, seja apreciada com um número alto de presenças.
Segundo a proposta, o foro especial por prerrogativa de função não mais valerá nos casos de crime comum, como corrupção. Assim, os agentes públicos passarão, caso a PEC vire lei, a ser julgados onde o eventual crime foi praticado, nas primeiras instâncias da Justiça comum. O texto assegura, no entanto, o foro nos casos de crime de responsabilidade, em decorrência do cargo que ocupam (atentados a direitos políticos, individuais e sociais; contra a segurança interna do país; contra a lei orçamentária e a probidade administrativa etc). Estudo feito por consultores do Senado aponta que, atualmente, mais de 54 mil pessoas têm direito a foro privilegiado no Brasil (detalhes no quadro abaixo).
Mais quatro PECs
Além da PEC do foro, também estão prontas para o plenário outras quatro propostas de emendas à Constituição, entre elas a que torna estupro um crime imprescritível (PEC 64/2016), também já aprovada em primeiro turno na semana passada.
Já as PECs 77/2015, que simplifica o regime de prestação de contas de pequenos municípios, e 103/2015, que autoriza o Congresso a entrar em recesso no meio do ano mesmo sem ter aprovado a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), ainda aguardam votação em primeiro turno. Nesta semana, senadores devem finalizar a primeira jornada de cinco discussões da PEC 2/2017, que impede a extinção dos tribunais de contas.
Regularização fundiária
Dez medidas provisórias trancam a pauta de votações em plenário nas sessões deliberativas ordinárias, cenário em que nada pode ser votado antes da análise dessas matérias – para resolver o impasse, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já anunciou realização de sessão extraordinária para a votação do projeto que regulamenta incentivos fiscais a estados (leia mais abaixo).
Uma das mais polêmicas é a MP 759/2016, que impõe mais regras para a regularização de terras da União ocupadas na Amazônia Legal e disciplina procedimentos para a regularização fundiária urbana, com revogação de dispositivos da Lei 11.977/2009. A medida autoriza a regularização de áreas com até 2,5 mil hectares e muda o modelo de pagamento aplicado a posseiros – eles deixarão de pagar de 10% a 80% do valor fixado para as dimensões de um imóvel em planilha de preços referenciais, que é concebida pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), e passarão a pagar de 10% (menores propriedades) a 50% (maiores) sobre um padrão de valores da chamada terra nua (ou virgem, sem intervenção humana).
Por se tratar de Amazônia, a medida provisória está relacionada à questão indígena, tema que tem provocado confrontos de índios com forças de segurança em Brasília e, ao redor do país, com agricultores e proprietários de terra. Como este site mostrou em 25 de abril, um grupo de indígenas favorável à demarcação de terras para suas comunidades tentou ocupar o Congresso e foi recebido com gases de pimenta e de efeito moral (veja vídeos e imagens).
O episódio alarmou Rodrigo Maia e demais lideranças da Câmara e do Senado, mas foi a ação de agentes penitenciários descontentes com a reforma da Previdência que levou o comando das duas Casas legislativas a isolar as cercanias do Congresso, restringindo o acesso ao interior dos prédios. Foi preciso que três entidades recorressem ao Supremo Tribunal Federal para assegurar o direito de acompanhar de perto as reformas patrocinadas pelo governo Temer no Parlamento.
Guerra fiscal e rito de MPs
Nesse clima de tensão, e diante da pauta carregada, os deputados também pretendem votar o projeto de lei complementar (PLP) 54/2015 que sugere um modelo de transição para isenções fiscais concedidas unilateralmente por estados – contexto chamado de “guerra fiscal”, com efeitos ao pacto federativo. O PLP estabelece prazos que variam entre 1 e 15 anos de vigência para isenções e incentivos atualmente praticados, convalidando-os todos eles. O texto deve ser votado na próxima terça-feira (16), em sessão extraordinária.
Além das MPs e desse projeto de lei, também consta da pauta de plenário a proposta de emenda à Constituição (PEC 70/2011) que altera regras de tramitação das medidas provisórias. De autoria do Senado, a proposição põe fim à obrigatoriedade de que comissões mistas (deputados e senadores) sejam formadas para analisar as medidas antes da votação em plenário, além de alterar prazos de deliberação – a vigência desse tipo de matéria passaria a ser de 120 dias corridos, e não mais de 60 dias prorrogáveis por igual período, mas o texto abre brechas para que o prazo de análise seja dez dias maior ou menor, a depender das circunstâncias.