A pobre estreia de Temer no G20

Folha de S.Paulo

Se se tornar o presidente efetivo até lá, Michel Temer fará sua apresentação à sociedade internacional durante a cúpula do G20 nos próximos dias 4 e 5, em Hangzhou (China).

Será tudo menos uma estreia apoteótica. Primeiro porque Temer carece do brilho que só o banho das urnas confere a governantes recém-empossados.

Luiz Inácio Lula da Silva, por exemplo, apresentou-se ao mundo (no caso dele, no Fórum de Davos, em 2003) e foi um sucesso de público e de crítica, um tanto por sua vitória eleitoral e muito por sua história de vida, realmente cinematográfica. Temer, ao contrário, tem uma biografia convencional.

Segundo fator: o Brasil de Temer está tendo o pior desempenho econômico entre todos os países do G20. Até a Rússia, a pior da classe no G20 anterior, passou o Brasil.

Os simpatizantes do novo governo podem dizer que a culpa não é dele, mas de Dilma Rousseff. Não deixa de ser verdade, mas para o resto do mundo é difícil entender como o companheiro de chapa de uma pessoa não é corresponsável pelas políticas adotadas.

Afinal, não se conhece uma única palavrinha de Temer contra o que Dilma fazia. Até fez questão de ser o candidato a vice em 2014, quando já operavam as políticas que acabaram levando ao desastre.

Mais complicado ainda é o fato de que os anúncios de Temer até agora vão na contramão do pensamento predominante hoje no G20.

O clubão das grandes economias comprometeu-se, na cúpula de 2013, a adotar políticas que levassem o mundo a crescer, até 2018, 2,1 pontos percentuais acima do que o Fundo Monetário Internacional previa naquele ano.

Como a previsão era de crescimento de 2,9%, tem-se, portanto, que, em 2018, o mundo deveria estar crescendo fabulosos 5%.

É uma meta que, a esta altura, parece inalcançável. Tanto que na mais recente reunião dos ministros de Economia do G20 anunciou-se, pela enésima vez, a disposição de “usar todas as ferramentas políticas, individual e coletivamente”, para alcançar um crescimento forte.

Até o Fundo Monetário Internacional, outrora guardião inflexível da ortodoxia, especificou uma das ferramentas necessárias: mais gasto público. O Brasil de Temer, além de estar contribuindo para arruinar a meta de crescer 5% em 2018, parece exclusivamente preocupado com o acerto das contas públicas, no pressuposto de que, uma vez alcançado este, o crescimento virá inexoravelmente.

Para o meu gosto, é mais fé do que ciência. De todo modo, a ênfase na agenda do novo governo não é o crescimento, ao contrário do que destacam, ao menos retoricamente, seus pares do G20.

De todo modo, o governo brasileiro festeja o fato de que a China, a anfitriã, incluiu “reformas estruturais” entre os temas para facilitar o crescimento. Essa expressão acaba sendo uma muleta retórica que países (ou o mundo em geral) usam quando o crescimento é medíocre, como ocorre atualmente.

O governo Temer também usa a muleta retórica, o que, em tese, significa que está em sintonia com o G20. É pouco para uma estreia que tem tudo para ser opaca.

Natural do Rio de Janeiro, é jornalista formado pela Favip. Desde 1990 é repórter do Jornal VANGUARDA, onde atua na editoria de política. Já foi correspondente do Jornal do Commercio, Jornal do Brasil, Folha de S. Paulo e Portal Terra.

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