Deputados priorizam contabilidade de votos e esquecem teor de denúncia contra Temer

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O presidente Michel Temer já entrou para a história como o primeiro a ser formalmente denunciado por corrupção no exercício do mandato. Encaminhada ao Supremo Tribunal Federal (STF), a peça acusatória depende de autorização da Câmara – onde o peemedebista tem maioria – para continuar sob investigação no STF. A questão começa a ser decidida em plenário na próxima quarta-feira (2). Mas há dias, a despeito da gravidade e do ineditismo da situação, o que mais se discute não é a suspeita de corrupção que pesa sobre Temer, e sim a quantidade de deputados que devem estar em plenário, regimentalmente, para decidir seu destino – o chamado “quórum de votação”.

“Quem quer tirar o presidente é a oposição. Ela que junte o quórum para tirar. A certeza de que a oposição não tem votos suficientes se dá pelo fato de que ela está querendo fugir do plenário”, disse ao Congresso em Foco o vice-líder do governo na Câmara Carlos Marun (PMDB-MS).

Enquanto o dia da votação não chega, números, contas, cargos, emendas, reuniões e muito falatório na imprensa continuam a dar o tom das discussões. Teses ganham cada vez mais espaço, como a de que interessa ao PT postergar a decisão da Câmara, no sentido de que a demora coincida com a apresentação de uma segunda denúncia contra Temer – a Procuradoria-Geral da República (PGR) diz haver indícios de que os crimes de obstrução de Justiça e associação criminosa também tenham sido cometidos. Informações de bastidor dão conta de que a oposição, PT à frente, não vai se esforçar para dar quórum, com a alegação de que esse papel é do governo, uma vez que tem maioria no Congresso.

Oposicionistas lembram que, caso tivesse mesmo o domínio de sua base de sustentação, o governo já teria resolvido a questão antes do início do recesso (entre 17 e 31 de julho) e promovido o arquivamento da denúncia. Mas os congressistas preferiram sair de férias, em meio à crise aguda do país. Sucessor de Temer em caso de afastamento, o próprio presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), fez questão de anunciar que a pausa parlamentar seria usufruída independentemente da pendência. Nesse domingo (30), Maia foi convidado por Temer para um jantar que teria a presença de Aécio Neves (PSDB-MG), também alvejado por delações premiadas, e preferiu não ir. O deputado promete manter a denúncia na pauta até que o impasse seja resolvido e, para as câmeras, diz prever um quórum de mais de 400 deputados já nesta quarta-feira (2).

Estratégia de Temer fracassa e Câmara deve votar só em agosto abertura de investigação

No duelo de versões, nas últimas semanas parlamentares não levaram a público qualquer discussão um pouco mais aprofundada sobre o conteúdo das acusações que pesam sobre o principal mandatário do país. Um dos principais soldados de Temer, Marun reforçou nesse domingo a impressão de que, mais do que a gravidade das acusações, o que está no foco é a medição de forças – ou seja, quem quiser o afastamento do presidente que trate de reunir votos para fazê-lo.

“Em termos de estratégia, hoje, o que nós temos que fazer é constranger a oposição, somada aos dissidentes da base, convencer essas pessoas a, pelo menos, não fugir à responsabilidade de votar – porque, em termos de resultado, no momento em que acontecer a votação, vejo um resultado que inexoravelmente vai ser a nossa vitória”, acrescentou o peemedebista, para quem não há otimismo por parte da base aliada, mas “realismo puro”.

“Arroto”

Líder do PT na Câmara, Carlos Zarattini (SP) diz que o peemedebista blefa para esconder a preocupação do governo. Segundo o petista, não procedem as teses de constrangimento, suscitada por Marun, nem a de que o PT pretende atrasar as discussões até a chegada da nova denúncia, o que daria mais peso à suspeição de Temer.

“Nós queremos tirar ele [Temer]. Se pudéssemos tirar agora, tiraríamos sem problema algum. Agora, se o tirarmos, vamos jogar fortemente na ideia das diretas. Não vamos aceitar Rodrigo Maia querer governar o Brasil por uma eleição indireta”, afirmou o deputado.

Ele avalia que as provas a serem entregues à PGR por Joesley Batista, presidente do grupo JBS e delator do esquema de corrupção que envolve Temer, vão abalar parlamentares que se mostram dispostos a defender o presidente em plenário. A notícia de que Joesley, que gravou conversa com Temer em encontro clandestino no Palácio do Jaburu, já finalizou o conjunto probatório foi reportagem de capa da revista Época nesse fim de semana.

“É um constrangimento. Cada deputado terá que falar o seu voto ao microfone. A situação é muito complicada. Marun está ‘arrotando’ [contando vantagem] aí sem nenhuma base. Ele sabe a dificuldade que ele tem”, acrescentou o petista, também enfatizando a questão dos números regimentais para a votação da denúncia.

Meta 342

O deputado petista fez referência ao placar virtual do “Movimento 342 agora”, em cujo título artistas e personalidades fazem referência ao quórum regimental mínimo e pedem votos para o afastamento de Temer. No hotsite “342agora.org.br”, a contagem até ontem era de 207 votos a favor da denúncia, 160 contra e 146 ainda indecisos – resultado que, para Zarattini, a dois dias da votação, sinaliza a fragmentação da base aliada, que já teve o apoio de mais de 400 deputados em diversas votações importantes, como a PEC do Teto de Gastos, promulgada em 15 de dezembro do ano passado.

“Esse número [207], na realidade, pelo menos é de 240 a 250 deputados favoráveis ao afastamento [de Temer]. A votação em plenário, neste momento, significa abrir uma cisão na base do governo”, observa o líder do PT.

A imprensa também tem produzido pesquisas de intenção de voto junto aos deputados. No levantamento veiculado no site do jornal Folha de S.Paulo, que diz ter consultado os 513 deputados, 188 se disseram a favor da investigação de Temer; 95 contra; 113 disseram ainda não saber como votarão; 61 afirmaram que não vão se pronunciar; e 52 não responderam; e outros 4 disseram que não vão votar.

O placar do site do jornal O Estado de S. Paulo não detalha tanto quanto o da Folha, mas tem números semelhantes. Segundo o Estadão, são os mesmos 188 a favor da denúncia, mas 110 contra (e não 95, como apontou a Folha). Na categoria “Outros”, aparecem 215 deputados.

“O que vai ter de pressão nestes dias, aqui, em cima dos deputados vai ser muito grande. Então, pode acontecer uma virada. Mas, ainda que não aconteça uma virada, o fato de haver uma divisão na base do governo já é muito importante para nós”, concluiu Zarattini.

Pedro Augusto é jornalista e repórter do Jornal VANGUARDA.

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