OPINIÃO: O circo da Copa

Por MENELAU JÚNIOR

A Copa do Mundo começa em poucos dias, mas na TV, no rádio, nas revistas e nos jornais ela já começou faz tempo. Nos intervalos comerciais, só se vê Copa do Mundo. Todos querendo obrigar quem pensa e quem não pensa a ser o mais patriótico dos brasileiros. Nesta Copa do Mundo, quem torce contra é traidor da pátria. Felipão e Neymar já ganharam a Copa – e milhões em publicidade ufanistoide. Só para se ter uma ideia, Neymar pede pelo menos 4 milhões de reais só para começar uma conversa com qualquer anunciante que tenha interesse em sua imagem. Um trabalhador que ganha o salário mínimo precisaria trabalhar mais de 400 anos para receber algo próximo.

Não é de hoje que o futebol é usado com fins muito diferentes do que a mera diversão. Durante o período da ditadura militar, os slogans tratavam de ensinar o povo – e a seleção – a ir “pra frente”. “Pra frente, Brasil!”. Agora, o governo torra milhões em propaganda para mostrar ao povo que o investimento valeu a pena, que “muitas obras vão ficar” como “legado” da Copa e que os brasileiros só ganharam com o evento. As TVs usam e abusam de imagens em câmera lenta para prolongar a emoção do gol, do grito dos torcedores e do lucro dos patrocinadores.

A “Copa das Copas”, como quer fazer crer a presidenta Dilma – aliás, a mesma que já declarou que não irá à abertura do torneio (porque sabe que levaria “a maior vaia da história deste país”) – , já é uma grande tragédia brasileira, independentemente do resultado. É uma tragédia para os brasileiros honestos que pagam impostos e não têm saúde, educação e segurança de qualidade. É uma tragédia para os brasileiros honestos que não usam seu dinheiro para pagar multas de mensaleiros. Gastamos quase 30 bilhões de reais, superfaturamos todos – TODOS! – os estádios e não terminamos 40% das obras de infraestrutura prometidas.

Levantamento da Folha de São Paulo mostra que apenas 10% das obras de mobilidade urbana foram concluídas. Ou seja, construímos estádios em lugares sem nenhuma tradição no futebol (Manaus, Cuiabá e Brasília, por exemplo) e deixamos de lado o que poderia ser realmente útil à população. A Arena Pernambuco, por exemplo, só será paga daqui a 35 anos.

Mas a propaganda – privada e pública – está aí para mostrar que todos devemos torcer pelo Brasil. O PT sabe que, se o Brasil perder, a catástrofe eleitoral será iminente. Lula acreditava que, durante a Copa, o PT estaria nos braços do povo, com Dilma prestes a ser reeleita. A realidade é muito diferente. Todos sabem que o quebra-quebra vai acontecer em todas as cidades, que os turistas serão assaltados e sequestrados, que os problemas de mobilidade urbana ficarão escancarados para o mundo inteiro. E Dilma e o PT estão desesperados diante do crescimento de seus adversários. Mas, apesar de tudo isso, a propaganda quer nos ensinar a torcer e morrer pelo Brasil.

Em poucos dias, estaremos lotando restaurantes, bares e todos os lugares em que houver uma TV para exercermos nosso dever patriótico – e quase “divino”! – de torcer pelo Brasil. O país, afinal, será “a pátria de chuteiras”. Minha família e meus amigos torcerão pelo Brasil. Eu também, mas de forma diferente. Não desejo que o Brasil vença a Copa. Perdendo, talvez pensemos de forma séria no que realmente interessa: educação, segurança, saúde. Em ano eleitoral, o circo da Copa do Mundo só interessa a quem quer nos fazer de palhaços.

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Menelau Júnior é professor de língua portuguesa. Escreve para o blog todas as quintas-feiras. E-mail: menelaujr@uol.com.br

OPINIÃO: Somos todos macacos?

Por MENELAU JÚNIOR

Semana passada, um gesto do jogador do Barcelona Daniel Alves chamou a atenção do mundo inteiro. Quando ia cobrar um escanteio, o brasileiro foi alvo de uma banana jogada por um torcedor. Associar morenos e negros a macacos é um xingamento em várias partes do mundo. Daniel, ironicamente, pegou a banana, descascou-a e a pôs inteirinha na boca. Em seguida, cobrou o escanteio e o jogo seguiu. Na internet, Neymar tirou uma foto ao lado do filho segurando uma banana e escreveu a hashtag #somostodosmacacos. Pronto: o slogan correu o mundo. O que pouca gente sabia é que o slogan fora criado anos antes por uma agência de publicidade.

É óbvio que a atitude de Daniel Alves ajudou a trazer à tona a sempre atual discussão sobre racismo e preconceito. É também óbvio que a turma do oba-oba – incluindo anônimos e muitos, muitos artistas – aderiu à “campanha”. Não aderi porque não sou macaco, embora creia que todos sejamos uma evolução deles. Questiono o sentido literal da expressão “somos todos macacos”. Ela, ao mesmo tempo em que dá a entender que os seres humanos são iguais, reforça a ideia de que negros são macacos. Ou seja, pode até haver uma boa intenção na mensagem, mas ela não deixa de reforçar preconceitos históricos.

Na internet, cada um escreve o que quer e posta o que quer. Uma amiga postou em seu perfil numa rede social: “Homem é homem, macaco é macaco, e racismo é crime”. Foi a frase mais inteligente que li sobre o assunto. Outro amigo aproveitou a deixa para fazer uma crítica ao sistema de cotas: “Se somos todos macacos, para que o sistema de cotas?”, questionou. Mas a maioria repetiu, como papagaio, o slogan “Somos todos macacos”.

Particularmente, não creio que o Brasil seja um país racista como governantes populistas tentam nos fazer crer. Preconceito há contra gordos, contra gays, contra loiras e contra negros. O problema por aqui é muito mais social que étnico. Por aqui, as pessoas sofrem preconceito porque “têm jeito de pobre”, porque “se vestem como pobres” ou porque são pobres. E aí não adianta ter olhos verdes e cabelos loiros. O nosso preconceito é contra a pobreza. Querer dividir o Brasil em pretos e brancos é só mais um recurso vergonhoso de quem abusa da inocência e da ignorância alheia.

Para terminar, macacos estão entre os animais mais inteligentes da natureza. Mais de 99% do nosso DNA é igual ao deles. As diferenças biológicas, portanto, são mínimas. Mas o suficiente para que macacos não se matem por causa de times de futebol, não sejam hipócritas em seus discursos, não matem seu semelhante por nada. Honestamente, os macacos não merecem a comparação com os seres humanos.

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OPINIÃO: Adeus, minha companheira

Por MENELAU JÚNIOR

Esta semana, perdi uma fiel companheira. Nós nos conhecemos em janeiro de 2007 e mantivemos, durante 7 anos e 4 meses, uma relação familiar. Mais que uma grande amiga, Gisele era uma filha.

Não foi fácil aceitar sua partida precoce. Por mais que eu soubesse que uma hora isso iria acontecer, nunca estive preparado para ficar sem ela. Não a vi nascer, porque quando nos conhecemos ela já era criança, mas a vi morrer, dando os últimos suspiros enquanto o médico tentava reanimá-la.

Nos últimos dias de sua vida, Gisele se queixava de dores. Tinha dificuldades para se levantar. E, depois, parecia que nem mais reconhecia a mim. Olhava para o nada, andava em círculos. Quando me fitava, seus olhos cabisbaixos pareciam me dizer que eu me preparasse para a ida sem volta que ela estava prestes a fazer.

Durante o tempo em que estivemos juntos, Gisele foi uma companheira fiel. Meiga, carinhosa, brincalhona. Gostava de ganhar brinquedos, odiava que lhe dissessem “tchau!”. Gisele não entendia a palavra “adeus”, mas sabia que o “tchau” era algo ruim.

Gisele, entretanto, arrumou um jeito só dela para me dar adeus. Na segunda-feira, quando acordei e me despedi dela porque iria trabalhar, ela ficou na sala de visitas, lugar em que nunca ficava. Rezei para as horas passarem logo e eu revê-la na hora do almoço. No fim da tarde, ela iria ao médico pela quinta vez em vinte dias. Mas Gisele não suportou.

Quando cheguei, ela estava na cozinha, como sempre ficava na hora do almoço. Ao me ver, foi até o quintal. Ajoelhei-me, abracei-a e lhe disse olhando nos olhos cabisbaixos: “Papai te ama!”. Ela me olhou pela última vez. Teve uma convulsão e perdeu os sentidos.

Socorrida, ainda foi levada à clínica, onde resistiu até as 17h40 min.

Chovia. Fiz questão de ficar ao lado dela para poder dizer: “Vai, meu amor, não quero que você sofra mais”.

Ela foi embora em silêncio. Eu fiquei com uma dor que insiste em não passar.

Gisele nasceu em 25 de dezembro de 2006. Tornei-me seu pai em 25 de janeiro de 2007. Gisele foi minha cadelinha da raça labrador desde o primeiro mês de vida. Gisele sempre será um grande amor. Ainda mais agora, que passei a odiar a palavra “tchau”…

Até a próxima semana.

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OPINIÃO: “O partido que ele é filiado”

Por MENELAU JÚNIOR

Tenho lido recentemente em órgãos de nossa imprensa frases do tipo “O partido que ele está filiado…”. Há, no fragmento, alguns elementos gramaticais interessantes a discutir.

A primeira questão seria ortográfica. Existe diferença entre “filiado” e “afiliado”? Para os dicionários, não. O Houaiss, versão eletrônica, traz, entre outras definições: “Agregar(-se), unir(-se) a corporação, clube, entidade, sociedade etc.; inscrever(-se) como sócio ou membro; afiliar(-se)”. Observou: “afiliar-se”. Por isso, pode-se dizer que o candidato Fulano está filiado (ou afiliado) ao partido X.

Entretanto, há um problema de regência verbal na oração em análise. O adjetivo “filiado” (ou “afiliado”) pede a preposição “a”. É possível filiar-se “a” determinado partido. Mas observe que no trecho “O partido que ele está filiado” essa preposição não aparece.

De fato, mesmo em textos formais já encontramos o pronome relativo “que” sem ser antecedido de preposição, mesmo quando a norma-padrão recomenda esse uso. Em outras palavras, a construção “O partido que ele está filiado…” deve ser substituída por “O partido a que (ou “ao qual”) ele está filiado…”. Encontrei também a forma “O partido em que ele está filiado…”. Nesse caso, o “em” não se justifica, uma vez que o adjetivo “filiado” pede a preposição “a”.

No site do TRE de Minas Gerais, encontrei a seguinte oração: “Para a filiação, é necessário que o eleitor se dirija à sede do partido ao qual pretenda se filiar com seu título de eleitor e preencha a ficha de filiação, em modelo próprio do partido”. Observe o uso adequado da forma “ao qual”: “…sede do partido ao qual pretenda se filiar”. É o verbo “filiar-se” que exige a preposição “a”.

Situação semelhante ocorre com a frase “A seção que o eleitor vai votar”. Ora, se o leitor vai votar, ele fará isso “em” uma seção. É por causa desse “em” que, numa construção formal, recomenda-se a forma “A seção EM QUE (ou “na qual”) o eleitor vai votar”.

Para você que se prepara para o Enem, é bom revisar regência verbal. Embora as questões de múltipla escolha não tratem de aspectos gramaticais minuciosos, a redação deve ser escrita em norma-padrão. Obedecer à regência é importante.

Até a próxima semana.

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OPINIÃO: O tempo passa…

Por MENELAU JÚNIOR

Caruaru está envolvida numa nova polêmica que envolve as ações da prefeitura. Agora, o assunto é a retirada de um relógio que fora erguido no coração da cidade, em frente à catedral, na famosa rua da Matriz.

O relógio não era nenhuma obra arquitetônica. Pelo contrário, apenas um conjunto de blocos quadrados cheios de publicidade. No alto, traindo quem buscava a hora certa, o imponente relógio, quase sempre atrasado.

Compreendo quem se lamente pela retirada do danado. Temos uma dificuldade enorme de nos livrar de memórias – e o relógio já fazia parte da rua da Matriz. Por outro lado, a cidade se moderniza e o espaço publicitário já não era conveniente.

Penso se nós tivéssemos de carregar no pulso o mesmo relógio durante décadas. Quase ninguém faz isso! Por que a cidade, então, teria de manter uma “obra” que nada tem de histórica, a não ser o fato de estar naquele lugar havia 15 anos?

Há outras questões bem mais importantes a tratar neste momento. O relógio podia até ser um símbolo, mas não vejo nenhum motivo – além do saudosismo – para que lamentemos sua ausência. Caruaru está mudando porque o tempo passa. Até para os relógios.

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OPINIÃO: Nosso Governador

Por MENELAU JÚNIOR

lyraAmanhã, 4 de abril, um fato político mais que especial marcará a política de nossa cidade: teremos o Governador.

O empresário João Soares Lyra Neto vem de uma família de políticos. Na década de 70, em plena ditadura militar, lutou junto com os mais importantes líderes políticos pela resistência democrática durante todo o período do regime militar. Filiado ao MDB (Movimento Democrático Brasileiro), chegou a ser presidente do partido em Caruaru. No início dos anos 80, começou a participar ativamente de campanhas políticas e fez parte da coordenação estadual pela retomada das Diretas-Já no país. Sua trajetória política teve início em 1988, quando, seguindo os passos do pai, João Lyra Filho, foi eleito prefeito de Caruaru, cargo que voltou a assumir em 1997, para um segundo mandato. Foi ainda líder do governo Miguel Arraes na Assembleia Legislativa durante seu mandato de deputado estadual. Lyra Neto já tem seu legado: como a geração precisa continuar, já preparou sua aguerrida filha para trilhar também o caminho do respeito e da dignidade neste mundo tão corrompido da política brasileira.

Lyra agora é o Governador de Pernambuco. E assim será nos próximos nove meses. Alicerce do agora ex-governador Eduardo Campos em seus dois bem-sucedidos mandatos, João Lyra é caso raro na política: tem o respeito e a verdadeira admiração até de seus opositores políticos. De estilo apaziguador, ele agora tem nas mãos os destinos de um dos estados que mais se desenvolveram nos últimos anos.

Prefeito de Caruaru duas vezes, João Lyra recebe de Eduardo Campos um estado que ele também ajudou a moldar. Para os caruaruenses, ter um filho no posto maior do estado deve ser motivo de esperança em dias ainda melhores. Mais que isso, para nós é motivo de orgulho saber que um homem de conduta irretocável estará à frente das decisões políticas de Pernambuco no momento em que o ex-governador se lança no maior desafio político da sua carreira.

O Brasil, infelizmente, não é referência de ética e honestidade quando se pensa em política. Há mais de uma década, escândalos de corrupção se sucedem ininterruptamente – mascarados por resultados animadores da economia. Neste momento difícil, em que indicadores econômicos mostram a fragilidade do país e a inépcia governamental impede o crescimento, Lyra tem a difícil missão de terminar bem um mandato de sucesso do qual ele sempre foi parte indissolúvel.

Como caruaruense apaixonado por esta cidade, sinto-me orgulhoso por ter João Lyra Neto como governador. Antes de um político de sucesso, Lyra é um homem ético, honesto e comprometido com as verdadeiras causas populares. No país da demagogia e do populismo desavergonhado, ter um governador como João Lyra Neto é uma honra e um privilégio.

Até a próxima semana.

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OPINIÃO: O mérito de Almério

Por MENELAU JÚNIOR

Caruaru tem sido brindada, vez ou outra, com bons álbuns de artistas locais. Curiosamente, quase nada de forró – numa terra que se intitula a Capital desse ritmo. Recomendo uma audição cuidadosa do álbum “Almério”, do artista homônimo.

Lançado no fim de 2013, o trabalho conta com 14 faixas, sendo nove músicas autorais e outras cinco composições de grandes nomes regionais, a exemplo de Valdir Santos, Isabela Moraes, Vertin Moura, Ícaro Tenório, Luciano Queiroga e Lula Queiroga. É possível observar influências da musicalidade local, mas nem de longe o trabalho de Almério pode ser classificado como regional. Com influências de vários artistas da MPB, Almério trouxe para nós um disco bonito, envolvente e suave.

A excelente “A busca” abre o álbum, com uma levada que lembra Djavan nos primeiros acordes. Mas é na parceria com Isabela Moraes, em “São João do Carneirinho”, que temos um dos melhores momentos do disco. A quarta faixa, “Além-homem”, é daquelas canções para ouvir à beira-mar, num fim de tarde. É uma linda canção de amor, sem a pieguice que normalmente acompanha esse tipo de composição.

Em “Não há muito o que fazer”, Almério fala com criatividade sobre dor, solidão e desolação de forma muito interessante. A ironia dos versos “Quando a bebida esgota/ e a sobriedade volta/ Sinceramente não há muito o que fazer” foi uma excelente sacada. Em “Minha casa de você”, quase todas as estrofes começam com “Não quero mais ficar em casa”, para terminar com a desconcertante declaração “Foi maldade preencher/ Minha casa de você/ Depois ir embora”.

Mas o álbum não é só lirismo. Em “Quantos homens têm o mesmo nome”, Almério escreve sobre um ex-mecânico que passou 19 anos preso por engano.

Em entrevista recente, Almério disse que “fez um disco para o mundo” e que pensa em “levá-lo para outros lugares e expandir o trabalho”, pois não quer “olhar para trás um dia e perceber o erro de não ter tentado. Muito menos olhar para o espelho e enxergar um músico que não deu certo”. Este primeiro álbum é um bom cartão de visitas. Precisa melhorar algo? Claro! Quem não precisa? O sotaque excessivamente marcante pode irritar pessoas menos tolerantes ao jeito nordestino de falar. Se quiser voar mais alto, Almério vai precisar amenizar seu sotaque, deixá-lo menos identitário. Talento, voz e boas composições ele tem de sobra. Quem gosta de boa música deve conhecer o trabalho dele.

Até a próxima semana.

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OPINIÃO: Blitz da língua

Por MENELAU JÚNIOR

Em sua edição de 11 de fevereiro de 2012, o Jornal do Commercio publicou, no caderno “Cidades”, matéria com o seguinte título: “Mais força e agilidade em blitzes da lei seca”. A questão é a seguinte: qual o verdadeiro plural de “blitz”?

Inicialmente, é preciso considerarmos que a palavra não pertence ao léxico da língua portuguesa – aliás, nem aparece no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras.

“Blitz” é uma redução de “Blitzkrieg”, uma união das palavras alemãs “krieg” (“guerra”) e “blitz” (“relâmpago”). A palavra passou a ser usada durante a Segunda Guerra Mundial para designar os devastadores ataques do exército alemão. Por extensão de sentido, passou a significar uma batida policial inesperada, geralmente mobilizando grande aparato.

Em alemão, existem duas formas de indicar o plural para essa palavra: “blitze” e “blitzen”. Aliás, dois dos mais importantes dicionários do país, o Aurélio e o Houaiss, registram como “blitze” o plural de “blitz”. Portanto, deveríamos escrever “duas blitze”.

O problema é que, para alguns autores, a palavra já estaria aportuguesada (ainda que seja muito estranho o encontro consonantal “tz”). Por causa disso, seu plural deveria obedecer às normas da língua portuguesa. No caso, pluralizamos as palavras terminadas em “Z” com o acréscimo de “-es”. “Juiz” tem como plural “juízes”; “raiz” tem “raízes” e “blitz”, portanto, “blitzes”.

A forma usada pelo supracitado jornal recorre, pois, a um plural aportuguesado – talvez até mesmo porque não aparece o artigo antes da palavra. Para a maioria dos leitores, a forma “blitze” seria realmente estranha, já que não temos palavras pluralizadas com o acréscimo apenas da letra “e”. “Blitzes” tem mais a cara do nosso idioma.

Entretanto, no mesmo dia em que o Jornal do Commercio publicou o título acima, o Tribuna da Bahia escreveu em seu site: “Por conta da falta de policiamento, a Superintendência de Trânsito e Transporte do Salvador (Transalvador) suspendeu as blitze de alcoolemia…”. Já o site do G1 (Globo.com) publicara, um dia antes, matéria com o seguinte título: “Blitze da Lei Seca terão mais mobilidade no Grande Recife”.

Portanto, se você quer usar uma forma incontestável, use “as blitze”. É estranho, mas segue a etimologia da palavra. Quem escreve “as blitzes” pode até estar usando a forma adequada à língua portuguesa, mas é bom lembrar que esse plural contraria a recomendação de importantes dicionários e de boa parte da imprensa.

Até a próxima semana.

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OPINIÃO: Você escolhe a concordância

Por MENELAU JÚNIOR

menelau colunaVeja essa manchete do Jornal do Commercio: “Faltam estrutura e médicos no Cisam”. A frase merece uma análise mais cuidadosa no que se refere à concordância verbal.

No padrão formal da linguagem, o verbo deve concordar com o núcleo do sujeito. Entretanto, quando o aparece antes do sujeito, é relativamente comum que não ocorra a concordância, principalmente na fala. Por isso, ouvimos por aí frases como “Falta cinco minutos para começar o jogo” (deveria ser “faltam”), “Cabe cinco pessoas no carro” (deveria ser “cabem”) e “Morreu três pessoas no acidente” (deveria ser “morreram”).

Entretanto, quando o sujeito é composto (tem dois ou mais núcleos) e o verbo o antecede, há duas concordâncias possíveis: o plural, levando em consideração os dois núcleos, ou com o elemento mais próximo.

No caso do título sob análise, temos um sujeito composto: “estrutura e médicos”. O verbo está anteposto: “Faltam”. E agora? Bem, o Jornal do Commercio acerta quando emprega o plural, fazendo o verbo concordar com “estrutura e médicos” – aliás, essa é a concordância mais adequada, uma vez que leva em consideração todos os elementos que compõem o sujeito. Entretanto, a forma “Falta estrutura e médicos no Cisam” (com verbo no singular) também estaria correta, mas aí o verbo estaria concordando apenas com o núcleo mais próximo, que é “estrutura”.

Marisa Monte, em sua canção “Gentileza”, nos dá um exemplo dessa concordância com o elemento mais próximo: “Apagaram tudo, pintaram tudo de cinza/ Só FICOU no muro TRISTEZA e tinta fresca”, canta a bela. Nesse caso, a forma “ficou” tem como sujeito “tristeza e tinta fresca”, mas se optou pelo singular fazendo-se a concordância apenas com “tristeza”.

Portanto, não se esqueça: nos casos em que o sujeito é composto e o verbo o antecede, você escolhe a concordância: no plural ou com o núcleo mais próximo.

Até a próxima semana.

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OPINIÃO: Carnaval brasileiro

Por MENELAU JÚNIOR

O Brasil é conhecido no exterior ou pelo futebol ou pelo carnaval. E só. Não temos universidades entre as melhores do mundo, nosso ensino fundamental é vergonhoso e matamos mais em um ano do que se matou na guerra do Iraque.

Os infantiloides ufanistas ainda querem acreditar que Deus é brasileiro. Imagina se não fosse!! Neste fim de semana, vamos mostrar ao mundo que nossas mulheres gostam de andar seminuas, que nossos jovens praticam sexo irresponsavelmente e que os homens exageram na bebida e vão dirigir alcoolizados. Traduzindo, é carnaval!

A maior festa brasileira é uma prova irrefutável de nossa mediocridade. Excetuando-se uma ou outra manifestação cultural, o carnaval brasileiro é um mistifório vulgar e banal. Mas nada que não possa ficar pior.

Basta olhar os mais recentes números da violência no Brasil. Por ano, são mais de 50 mil assassinatos. 50 mil. Isso significa que, por dia, aproximadamente 137 pessoas são mortas. São quase 6 por hora. Uma a cada 10 minutos.

Os números são alarmantes também quando o quesito é morte no trânsito. E depois do alarde Lei Seca, tudo já voltou ao normal. A polícia não tem bafômetros suficientes, e o cidadão pode se recusar a fazer o teste. Ou seja, é lei para inglês ver.

Só para se ter uma ideia da selvageria brasileira, em 2008, enquanto os Estados Unidos obtiveram uma taxa de 12,5 mortes a cada 100.000 habitantes, o Brasil apresentou uma taxa de 30,1, sendo que a frota de carros norte-americana é o triplo da brasileira. Matamos muito mais com muito menos!!

O Brasil é conhecido no exterior ou pelo futebol ou pelo carnaval. Nosso futebol já não é o melhor do mundo faz algum tempo. Nosso carnaval é grandioso em mortes, em exploração sexual, em consumo de bebidas alcoólicas. De fato, temos muitos motivos para comemorar. Já pegou sua fantasia?

Até a próxima semana.

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