A Frente Parlamentar Evangélica anunciou, na semana passada, que dois deputados federais se revezarão, a cada seis meses, na presidência do bloco: Eli Borges (PL-TO) e Silas Câmara (Republicanos-AM). Borges assumiu o cargo na quarta-feira e ficará até julho, quando passa o comando para Câmara.
A bancada iniciou as atividades legislativas em um cenário diferente do que havia no ano passado. Durante o governo de Jair Bolsonaro, os evangélicos tiveram forte protagonismo nas duas casas legislativas e, também, no Executivo, uma vez que o então presidente, grande aliado das igrejas neopentecostais, defendia as pautas de costumes, como combate ao aborto e à liberação do uso de drogas. Segundo o novo presidente da frente, porém, mesmo não estando “na bancada do poder”, a firmeza na defesa de pautas conservadores “não será amenizada”.
“A frente respeita as autoridades, mas as tratativas são institucionais, nunca individuais. A firmeza na defesa dessas pautas não será amenizada. Continuaremos como uma Frente que não está no balcão do poder para amenizar as pautas que são nossas, que são caras para nós. Mas sempre de um jeito respeitoso”, declarou Eli Borges ao Correio (leia a entrevista ao lado).
A divisão da presidência foi costurada na semana retrasada, após um racha inédito na bancada. Desde sua criação, em 2003, o presidente da Frente foi decidido por aclamação. Dessa vez, houve divisão entre apoiadores de Eli e de Silas. O senador Carlos Viana (Podemos-MG) e o deputado Otoni de Paula (MDB-RJ) também lançaram seus nomes ao cargo, mas retiraram a candidatura.
O presidente anterior, Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), e Cezinha de Madureira (PSD-SP), com quem dividiu o mandato em períodos de um ano, foram os fiadores do acordo firmado. A proposta inicial de que Eli e Silas também dividissem a presidência por um ano cada foi rejeitada, levando a uma tentativa frustrada de votação ocorrida na em 2 de fevereiro, na abertura do ano legislativo.
Segundo a frente, houve um problema técnico no sistema da Câmara dos Deputados utilizado para o pleito, devido ao alto tráfego no primeiro dia de atividade legislativa. Durante a votação, havia mais votos do que parlamentares registrados na lista de presença. Após discussão e ameaças de judicialização caso o resultado do pleito fosse oficializado, Sóstenes decidiu pela nulidade do processo e convocou nova eleição para 15 de fevereiro. Com o acordo da semana passada, porém, a sessão não ocorrerá.
Rachadinha
Eli Borges está iniciando seu segundo mandato na Casa, e é considerado relativamente novo, em comparação com outros membros da frente. Silas Câmara, por sua vez, já presidiu o grupo e completou 20 anos de mandato. Silas, porém, sofreu forte resistência para assumir o cargo. O parlamentar firmou um acordo no fim do ano passado em um processo no qual era acusado de rachadinha, por desvio de salários de assessores entre 2000 e 2001. Silas confessou e se comprometeu a pagar multa de R$ 242 mil para anular o processo como forma de compensação ao Erário.
Tanto Eli quando Silas apoiaram a reeleição de Jair Bolsonaro, mas o deputado do Republicanos se aproximou mais do governo Lula e foi apoiado pela base governista à presidência da bancada evangélica.
Em seu primeiro discurso aos parlamentares, na quarta, Eli Borges declarou que a Frente atua na “luta contra uma série de ideologias”, e que terá que trabalhar sobre os temas de forma equilibrada e institucional.
A expectativa é que os evangélicos atuem mais fortemente contra pautas identitárias, como as que envolvem o aborto ou os direitos de pessoas LGBTQIA . Após assumirem protagonismo na gestão de Bolsonaro, parlamentares da frente temem perder espaço, mesmo com os acenos de Lula ao público religioso — considerado gesto insuficiente. Eles criticam, por exemplo, a linguagem neutra usada pelo novo governo na posse de ministros, e não vêem ações concretas que sinalizem participação ou diálogo com evangélicos no Executivo.
Porém, apesar de uma grande parcela dos membros ser bolsonarista, aliados fortes de Lula como André Janones (Avante-MG) e Benedita da Silva (PT-RJ) também fazem parte do grupo. Parlamentares de partidos como o MDB, PSD e União Brasil, que compõem a base governista, devem manter sua atuação alinhada às pautas de Lula, devido aos acordos partidários.
A bancada tenta agora ampliar seu tamanho e influência dentro da Casa. Segundo Eli Borges, o número de parlamentares alinhados à causa evangélica cresceu 15%. Também chama a atenção a conquista de espaços de decisão dentro da Câmara. Nas eleições da Mesa Diretora a Frente conseguiu o 1º vice-presidente, deputado Marcos Pereira (Republicanos-SP) e o 2º vice-presidente, Sóstenes Cavalcante. A formação na nova legislatura ainda não foi oficialmente computada, mas a estimativa é que a Frente seja composta por 132 deputados e 14 senadores.
Correio Braziliense