Após conhecer a prática da Justiça Restaurativa promovida pela Coordenadoria da Infância e Juventude, no Centro Integrado da Criança e do Adolescente (Cica), o conselheiro e coordenador do Comitê da Justiça Restaurativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, visitou o Fórum Desembargador Rodolfo Aureliano, na tarde da quinta-feira (9/8). No prédio, o ministro foi apresentado às práticas desenvolvidas na área pelo Núcleo de Conciliação (Nupemec) e pela Vara de Execução Penas Alternativas (Vepa) do Judiciário estadual pernambucano. Luiz Philippe Vieira de Mello Filho estava acompanhado do também conselheiro e membro do Comitê Gestor de Justiça Restaurativa do CNJ, o juiz de direito do Tribunal de Justiça de Sergipe (TJSE), Haroldo Luiz Rigo da Silva
A Justiça Restaurativa é um conjunto ordenado e sistêmico de princípios, métodos, técnicas e atividades próprias, que visa à conscientização sobre os fatores relacionais, institucionais e sociais motivadores de conflitos e violência, e por meio do qual os conflitos que geram dano, concreto ou abstrato são solucionados. A Justiça Restaurativa se difere da Justiça punitiva e retributiva, e tem como pauta a escuta de todas as pessoas envolvidas em conflitos.
O coordenador-geral do Nupemec, desembargador Erik Simões, falou do trabalho desenvolvido pela Casa de Justiça e Cidadania (CJC) do Coque. A unidade foi a primeira a ser instalada no estado e tem como objetivo promover ações destinadas à efetiva participação do cidadão e da comunidade na solução de demandas por meio da conciliação, além de possibilitar a aproximação com o Poder Judiciário.
“Considero o trabalho desenvolvido na Casa de Justiça e Cidadania, no Coque, extraordinário e precursor da Justiça Restaurativa do Nupemec por meio do qual promovemos uma prática de inclusão social dos moradores da localidade. Por mês são realizados cerca de 300 atendimentos, que abrangem a prática da conciliação, a partir dos acordos realizados, a assistência psicológica e social dada aos moradores, e a orientação jurídica. Conseguimos também promover a cidadania através de convênios com órgãos públicos que nos permitem oferecer a retirada de documentos, primordial a todo cidadão, e o encaminhamento para solução de demandas relacionadas à saúde em instituições dos setores público e privado. Realizamos, ainda, casamento coletivo de forma gratuita, contando nessas ocasiões com a parceria de empresas que promovem a festa com bolo, e a apresentação da Orquestra Criança Cidadã. Então, buscamos exatamente proporcionar o acolhimento do cidadão nas suas necessidades mais básicas. A partir desse trabalho houve uma queda efetiva da criminalidade no local”, pontuou Erik Simões. O TJPE dispõe de mais 17 Casas de Justiça e Cidadania no estado.
A coordenadora da Casa de Justiça do Coque, Djanira Carneiro, falou da relevância desse trabalho de acolhimento e da inclusão do cidadão nessas comunidades menos assistidas pelo Poder Público. “Muitas pessoas chegam à Casa de Justiça querendo apenas serem ouvidas e no momento que paramos e escutamos, buscamos entender o que está sendo trazido ali, quais as ações que podemos desenvolver, de que forma podemos auxiliá-las ou encaminhá-las para a resolução daquelas demandas. Não é fácil convivermos com pessoas que não têm o mínimo de assistência, é frustrante vê-las passando por àquela realidade, mas é recompensador sabermos que estamos ali para trazer perspectiva de mudança para elas”, observou.
O ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho falou da necessidade de mudança da Justiça no sentido de deixar de ser apenas uma consolidação de doutrinas e de teorias direcionada ao julgamento de ações, passando a enxergar os que mais necessitam na população ao utilizar o poder de transformar vidas por meio de ações sociais e inclusivas de direitos. “Precisamos promover mais cidadania para àquelas pessoas invisíveis, que não são vistas pela nossa sociedade. As pessoas só querem ser ouvidas e ter uma nova perspectiva de vida. Nós temos uma capacidade muito grande de transformar histórias. Ao realizar esse trabalho social, vocês provam que é possível o Judiciário exercer esse papel, que reduz a desigualdade social, diminui a criminalização, e leva a uma possibilidade de sonho para cada cidadão que está ali sendo ouvido. A Justiça precisa sair dos gabinetes, ir às comunidades, ouvir as pessoas, e exercer a sua função restaurativa”, destacou.
Vepa – O trabalho desenvolvido na área de Justiça Restaurativa da Vara de Execução de Penas Alternativas, foi apresentado pelo juiz titular da unidade, André Santana. A Vara tem comoatribuições aplicar, fiscalizar e monitorar o cumprimento das penas restritivas de direitos e ainda da suspensão condicional da pena e do processo pelos infratores de pequeno e médio potencial ofensivo, sem recorrer ao encarceramento.
Na unidade é desenvolvido o trabalho do Centro Interdisciplinar de Acompanhamento a Penas e Medidas Alternativas (Capema), que realiza o acompanhamento dos cumpridores de penas restritivas de direitos, bem como das medidas de suspensão do processo e da pena. O centro é composto por uma equipe psicossocial, formada por psicólogos e assistentes sociais, além de estagiários de ambas as especialidades e de secretariado, tendo como gestora Lúcia Freire.
“No Capema trabalha-se com a perspectiva de ultrapassar a esfera da fiscalização do cumprimento, percebendo o sujeito em sua totalidade e complexidade sócio-econômica, familiar, e psicológica. Atuamos por meio da formação de círculos de debates para a construção de paz, desde 2016, já temos quase 300 círculos realizados e 744 pessoas que passaram por esses círculos. Preparamos um círculo muito importante no final de 2022, que foi com mulheres que praticaram o delito de tráfico de drogas e de furto. Depois desses círculos, elas participaram de um curso de cabeleireira, com duração de três meses, recebendo kits para poder trabalhar. Agora, no fim de dezembro, uma parte dessas mulheres estavam se mantendo com essa atividade. Essas horas dos cursos também foram computadas como cumprimento da pena porque estimula a pessoa a transformar a sua vida”, revelou Lúcia Freire.
O juiz André Santana explicou como se dá esse processo de encaminhamento ao Capema. “A Vara realiza a conversão da pena da pessoa que cometeu uma infração e a direciona para o Capema avaliar sua a situação, encaminhá-la para a prestação dos serviços e monitorar o cumprimento das penas alternativas. Então, eles têm esse primeiro momento de círculos de construção de paz no Centro e isso faz uma grande diferença porque eles começam a sentir a partir dali que estão sendo acolhidos na resolução de seus conflitos e passam a ter a perspectiva da construção de uma nova realidade”, afirmou o magistrado.
Presentes – Participaram também da visita ao Fórum Desembargador Rodolfo Aureliano, a coordenadora da Infância e Juventude, juíza Hélia Viegas; a representante da Justiça Restaurativa da Coordenadoria da Infância e Juventude, Hebe Pires; o coordenador geral adjunto do Nupemec, juiz José Alberto de Barros Freitas Filho; a secretária-executiva do Nupemec, Tarciana Chalegre; o gerente de Organização, Métodos e Tecnologias, Edson Roberto Gonçalves Dias; e a gerente de Programas Especiais, Cleide Márcia de Farias, dentre outros servidores dos dois setores.