Ao decidir por subir a taxa básica de juros, a Selic, para 6,25%, na última semana, o Banco Central (BC) passou a projetar uma inflação em 3,7% em 2022, acima da meta de 3,5% para o ano. A avaliação consta na ata da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) divulgada nesta terça-feira.
Essa projeção é uma mudança em relação à reunião realizada em agosto, quando o Copom decidiu por subir os juros para 5,25%. Naquele época, o cenário básico do BC apontava para projeções de inflação “alinhadas” às metas de 2022, 3,5% e 2023, 3,25%. Há um intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual (p.p) para cima ou para baixo no cumprimento da meta.
No documento divulgado nesta terça, a inflação de 3,7% no próximo ano e de 3,2% em 2023, quando a meta será de 3,25%, constam no cenário básico do Copom.
“De acordo com o cenário básico, que utiliza a trajetória para a taxa de juros extraída da pesquisa Focus, o câmbio seguindo a paridade do poder de compra e os preços de commodities em dólares estáveis em termos reais, as projeções de inflação estão ligeiramente acima da meta para 2022 e ao redor da meta para 2023”, aponta o documento.
Para 2021, o BC também revisou suas projeções. Em agosto, a expectativa era que a inflação chegasse a 6,5% no final do ano. Agora, a previsão é de 8,5%. A avaliação é que a inflação ao consumidor segue elevada, com alta nos bens industriais que deve persistir no curto prazo.
“Ademais, nos últimos meses os preços dos serviços cresceram a taxas mais elevadas, refletindo a gradual normalização da atividade no setor, dinâmica que já era esperada. Adicionalmente, persistem as pressões sobre componentes voláteis como alimentos, combustíveis e, especialmente, energia elétrica, que refletem fatores como câmbio, preços de commodities e condições climáticas desfavoráveis”, diz a ata.
Esse movimento é parecido com o do mercado, que vem revisando suas expectativas de inflação para este ano e para 2022, embora não tenha alterado sua projeção para 2023. Segundo o relatório Focus, o IPCA deve ficar em 4,12% em 2022 e 3,25% em 2023.
Em 12 meses encerrados em setembro, o IPCA-15 de setembro atingiu 10%. O indicador mede as variações de preços entre os dias 15 de cada mês e, por isso, serve como uma prévia do IPCA, usado nas metas de inflação do governo.
Nessa segunda-feira, o presidente Jair Bolsonaro admitiu que, para debelar a inflação que assola o país, ele diz ser um “zero à esquerda” em economia, mas que deposita sua confiança no presidente do Banco Central, Roberto Campos.
De acordo com a ata, os riscos fiscais estão “implicando” em um viés de alta nas projeções e esse peso tem justificado uma alta maior dos juros para controlar a inflação. O documento aponta que esse patamar seria inclusive acima do usado no cenário básico, em que a Selic ficaria em 8,25% em 2021 e 8,5% em 2022.
Com isso, levando em conta o estágio do ciclo de altas nos juros e as simulações, o BC considera que o atual ritmo de ajuste, de 1 p.p a cada reunião é adequado e um aumento da magnitude do ciclo é a “estratégia mais apropriada” para atingir as metas de inflação. O presidente do BC, Roberto Campos Neto, disse antes da reunião do Copom que fará o que for preciso para levar a inflação para a meta.
Alexandre Almeida, economista da CM Capital, afirmou que além do 1 p.p na próxima reunião, ele projeta uma outra alta de 1 p.p em dezembro, fechando o ano em 8,25%. Para o próximo, o economista apontou que a sinalização do BC de “aumento da magnitude do ciclo” pode significar uma continuação das altas, mas em níveis mais baixos.
— Mesmo para 2022, o mercado já começa a colocar alguns ajustes menores de 75 pontos-base (0,75 p.p) na primeira reunião de 2022 e ajustes menores nas duas reuniões subsequentes, isso acaba sendo destacado pelo BC — explicou Almeida.
O economista também destaca que essa alteração de cenário para o ano que vem poderá ser vista nas expectativas do mercado, que devem subir as projeções para os juros e diminuir as de PIB. A CM Capital já esperava juros mais altos no próximo ano e espera crescimento de 0,9%.
— Acaba tendo uma perspectiva de piora, porque com elevação da perspectiva de juros, você está removendo incentivos em termos de nível de investimento, isso tende a fazer uma revisão das expectativas de PIB para baixo — apontou.
Apesar das recentes altas nas projeções de inflação e revisões para baixo na expectativa de crescimento, o Banco Central ainda vê um “crescimento robusto” no segundo semestre deste ano. Segundo o Focus, o PIB deve crescer 5,04% em 2021
“Ao resultado do PIB do segundo trimestre ligeiramente melhor que o esperado, seguiram-se divulgações de alta frequência marginalmente mais negativas, ainda que evoluindo favoravelmente. Parte dessas revisões decorre de uma antecipação do crescimento esperado para alguns dos setores mais atingidos pela pandemia; outra parte deriva da menor produção industrial decorrente da manutenção de dificuldades nas cadeias de suprimentos”.
E seguiu:
“O Comitê manteve a visão de uma retomada robusta da atividade no segundo semestre, na medida em que os efeitos da vacinação sejam sentidos de forma mais abrangente”, diz o documento.
A ata ainda aponta que o crescimento econômico em 2022 será beneficiado por três fatores: recuperação do mercado de trabalho e setor de serviços, desempenho do setor agropecuário e da indústria extrativa e “resquícios” do processo de normalização da economia.
Sobre emprego, o Copom avaliou que o mercado de trabalho segue em recuperação, mas a diferença entre os números da PNAD Contínua, pesquisa sobre desemprego feita pelo IBGE e do Novo Caged, divulgação do Ministério da Economia, dificulta a avaliação.
“O recuo da taxa de desocupação com crescimento da força de trabalho e da população ocupada indica que o mercado de trabalho segue em recuperação. Todavia, os níveis das duas últimas variáveis ainda consideravelmente abaixo dos observados antes da pandemia sugerem hiato remanescente no mercado de trabalho”, apontou.