Estadão Conteúdo
Na Operação Lava Jato que vai imortalizar nas telonas do cinema a história do maior escândalo de corrupção do Brasil, a equipe de delegados da Polícia Federal tem quatro integrantes: Antonio Calloni, Flavia Alessandra, Bruce Gomlesvky e João Baldasserini.
Na vida real, o time é maior e fez cada protagonista reunir os feitos e trejeitos de mais de um investigador da força-tarefa, que abalou a República, nos últimos três anos, ao levar para cadeia poderosos políticos e empreiteiros do País.
O elenco de “globais” desembarcou em Curitiba, a “capital da Lava Jato”, neste mês de novembro para começar as filmagens do longa-metragem “Polícia Federal – A Lei é para todos”, inspirado nas investigações do escândalo Petrobras. Com investimento de R$ 14 milhões, o filme tem previsão de lançamento para maio de 2017. Foram sete dias de captação de imagens.
Na semana em que o Grupo Odebrecht começou a fechar a maior e mais bombástica delação da Lava Jato e o juiz federal Sérgio Moro iniciou as audiências do processo contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a reportagem entrevistou personagens envolvidos, direta e indiretamente, nas filmagens e montou, em forma de roteiro de cinema, um registro sobre a passagem da equipe, dirigida por Marcelo Antunez e produzida por Tomislav Blazink, por Curitiba.
FADE IN
CENA 1 – INTERNA – SEDE DA PF, CURITIBA – DIA
Na sala do delegado Márcio Anselmo, o ator Bruce Gomlesvky conversa e observa. Depois de viver o líder da Legião Urbana, Renato Russo, nos teatros, ele absorve o temperamento e o gesticular de seu espelho da vida real no longa-metragem inspirado na Operação Lava Jato.
Corta para vista geral da sala: pilhas de pastas de inquéritos, laudos, relatórios estão sobre e sob a mesa, amontoadas no chão, sobre os armários.
Anselmo e a delegada Erika Mialik Marena foram os primeiros investigadores da equipe da força-tarefa, que reúne PF, Ministério Público Federal e Receita Federal, a fisgar um dos alvos centrais do bilionário esquema de corrupção na Petrobras: Alberto Youssef.
Nas investigações, o doleiro foi o elo entre a rede de operadores financeiros que lavava dinheiro para políticos, agentes públicos e empreiteiros, num verdadeiro mall do câmbio negro, na capital federal, e a corrupção na Petrobrás. A descoberta, em 2013, marca o início do filme.
CENA 2 – EXTERNA – PORTÃO DE ENTRADA DA PF, CURITIBA – DIA
Pedro Dias acordou cedo e foi para o bairro Santa Cândida. O movimento no prédio da Polícia Federal é da Lava Jato, mas não são políticos, empresários corruptos presos que chegaram. São atores, produtores e cinegrafistas e suas parafernálias de fazer filme. Nas últimas três semanas, a equipe dirigida por Marcelo Antunez se instalou em um hotel de Curitiba e fez uma imersão com seus representados da vida real, antes de iniciarem as gravações do longa. Serão rodadas cenas ainda em São Paulo, no Rio e Brasília.
O global Antonio Calloni é o delegado Igor Romário de Paula, chefe da equipe de investigadores do escândalo Petrobras, que narra a história. Bruce, é Márcio Anselmo, no filme, Júlio Cesar. João Baldasserini será o delegado Maurício Moscardi, responsável por coordenar a maior parte das operações ostensivas. Todos eles representam vários delegados, em situações distintas.
Corta para movimento de figurante e curiosos que se aglomeraram na sede da PF, em Curitiba, para participar e acompanhar as filmagens. Seu Pedro, que desaparece na multidão, quer ver mesmo é a atriz que representará nas telonas as delegadas Erika e Renata Silva: Flávia Alessandra, que faz a personagem Bia.
CENA 3 – EXTERNA – RODOVIA PR-510, CURITIBA – DIA
O anúncio da produtora de elencos dizia: “Figuração para longa-metragem. Onde: Curitiba. Quando: 18 a 26 de novembro de 2016. Cachê: R$ 50,00 a diária.” A busca foi para o longa-metragem da Lava Jato. Foram contratados cerca de 500 candidatos a atores e curiosos. Os delegados de Curitiba – os verdadeiros – atuaram em momentos chaves como figurantes nas rodagens.
Corta para rodovia, onde uma equipe da Polícia Federal Rodoviária aborda um caminhão de palmito, que carregava cocaína. O fato ocorreu em 2013, os traficantes usavam a mesma lavanderia de dinheiro associada à Youssef, que funcionava no Posto da Torre, em Brasília, a três quilômetros do Congresso.
Corta para entrada da Justiça Federal, onde o juiz Sérgio Moro, que será vivido por Marcelo Serrado, pedestres, manifestantes e repórteres se concentram em um ato pró Lava Jato.
Repórter: Que tipo de filmagens foram feitas em Curitiba?
Tomislav: As cenas feitas em Curitiba envolvem algumas fases da Lava Jato e uma cena de impacto, que foi onde tudo começou, com relação ao Youssef e o caminhão de palmito apreendido com drogas, essas cenas foram gravadas em uma estrada, onde as coisas aconteceram. Outra cena com muita gente em volvida foi na frente da Justiça Federal, onde fica o Moro, teve bastante figuração.
A Lava Jato do cinema concentra sua história nos bastidores das investigações e na vida dos investigadores e investigados. Quem esperar um thriller policial com tiros, bombas, sangue e muita ação, vai se decepcionar. Os atores simulam a dinâmica das investigações, a tensão durante as deflagrações de operações ostensivas, reproduz as entrevistas coletivas à imprensa nos dias de buscas e prisões.
Na sala do chefe dos investigadores, onde a equipe está reunida. É fim do primeiro ano de apurações, alguns delegados foram alvos de reportagens com ataques pessoais na imprensa, após a venda de dossiês, e pensam em deixar a equipe. Problemas de saúde com familiares agrava a tensão do momento.
Corta para desenho feito pela filha de um dos delegados. O pai retratado como um super-herói com a camisa da Federal serviu de incentivo para parte da equipe da vida real e ficou por dias no grupo fechado de whatsapp dos investigadores.
Repórter: Que tipo de situação a equipe do filme quis saber?
Delegado: Naquele momento que prendemos os primeiros empresários, fomos alvos de ataques, havia problemas com familiares da equipe, alguns pensaram em deixar o grupo. Foi um momento de superação grande e união para todos nós. Isso foi algo que eles quiseram saber.
CENA 5 – INTERNA – AEROPORTO DE CONGONHAS, SÃO PAULO – DIA
O filme termina na 24ª fase da Lava Jato, batizada de Operação Aletheia, que em março levou o ex-presidente Lula coercitivamente para depor, em São Paulo. Nas telonas, o petista será interpretado por Ary Fontoura, o prefeito Florindo Abelha, da novela Roque Santeiro. O delegado Ivan Leon (Calloni) é quem faz o interrogatório do ex-presidente, em sala reservada do Aeroporto de Congonhas.
Por todo País, protestos pró e contra as investigações, que atingiam seu mais importante alvo político. Os grampos telefônicos, divulgados pelo juiz Sérgio Moro, dias depois, em que Lula foi flagrado em conversas suspeitas com a ex-presidente Dilma Rousseff também fazem parte do “A Lei é para todos”.
Repórter: Qual a história da Lava Jato dos cinemas?
Antunez: Conto a história da investigação da Lava Jato sob o ponto de vista dos investigadores. Minha abordagem é mostrar como as peças desse intricado quebra-cabeça foram se encaixando. Quero colocar o público no lugar dos investigadores. Meu filme não é um movimento político, é um filme de entretenimento, que fala sobre um assunto atual que esbarrou na política.