O Globo
As Forças Armadas farão inspeções rotineiras dentro dos presídios estaduais, para fazer apreensões, a depender da aprovação dos governadores de cada estado. O presidente Michel Temer, por meio do porta-voz, afirmou que a crise no sistema prisional atingiu “contornos nacionais” e pede ações “extraordinárias”. O anúncio foi feito após reunião do presidente com órgãos de inteligência no Palácio do Planalto nesta terça-feira.
“Haverá inspeções rotineiras dos presídios com vistas à detecção e apreensão de materiais proibidos. Essa operação visa a restaurar a normalidade e os padrões básicos de segurança dos estabelecimentos carcerários brasileiros”, declarou Temer por meio do porta-voz, Alexandre Parola.
O governo federal também anunciou que haverá mais integração entre os órgãos de segurança nacional, como aconteceu na Olimpíada do Rio, no ano passado, com um centro de controle e com comunicação facilitada entre os agentes. Desta vez, o trabalho será focado nas facções criminosas nos presídios.
Como os estados são os responsáveis constitucionais pelos presídios, os governadores terão de autorizar a presença das Forças Armadas dentro das cadeias. O governo ainda detalhará a proposta, mas as ações serão periódicas, e o contato direto com os detentos vai continuar sendo feito pela polícia do estado. O Ministério da Defesa já está de acordo com a ideia.
Também foram dois criados grupos de trabalho. Uma comissão — formada por membro dos três Poderes e sociedade civil — terá a missão de “reformar” o sistema penitenciário. Foi anunciado ainda um “comitê de integração e cooperação” na área de inteligência.
PLANALTO MUDA TOM
Em uma mudança radical de tom do presidente sobre o sistema penitenciário, o uso das Forças Armadas em presídios estaduais é visto no Palácio do Planalto como uma resposta à ameaça “iminente” de colapso das carceragens. No governo, as operações futuras dos militares são comparadas à Força de Pacificação do Complexo da Maré, pelo caráter provisório e pelas surpresas das operações. Cada governador deverá solicitar ajuda federal, e o presidente Temer decidirá caso a caso.
A ideia de usar as Forças Armadas é comparada à Força de Pacificação do Complexo da Maré, no Rio, já que as ações serão pontuais e com tempo limitado. Assim que a situação voltar à normalidade, o governo estadual retoma a gestão. Os militares ficaram um ano e três meses no complexo da Maré, que tem 15 favelas e cerca de 150 mil pessoas, e realizaram 83 mil ações, 674 prisões e 255 apreensões de menores. As inspeções periódicas das Forças Armadas serão feitas de surpresa, e ainda não se sabe quais tropas irão para quais presídios. O orçamento também é desconhecido.
Auxiliares do presidente Michel Temer argumentam que a Força Nacional não daria conta da situação “dramática” das carceragens brasileiras, e que o governo teme que a crise se espalhe para outros estados. A medida é vista como uma resposta mais concreta à crise penitenciária, e com potencial de impacto em curto prazo. Esses auxiliares também preveem que o combate dos militares deve ser muito mais “duro” do que os das forças de segurança estaduais.
“Se as rebeliões continuarem e chegarem a outros estados, a panela estoura”, disse um assessor do Planalto.
Os debates são intensos no governo. Na manhã desta terça-feira, secretários de segurança estaduais de Justiça, Segurança e Assuntos Penitenciários foram ao Ministério da Justiça. Ainda nesta terça-feira, a Associação dos Magistrados Brasileiros reúne juízes de Varas de Execução Penal de todo o Brasil. Temer, no entanto, cancelou uma reunião que teria nesta terça-feira com todos os governadores. A intenção é dividi-los em grupos menores, de acordo com perfis dos presídios.
O tom do presidente mudou quanto aos massacres nos presídios, que já deixaram mais de 130 mortos. Somente quatro dias de silêncio total após o primeiro episódio, em Manaus com 56 detentos brutalmente assassinados, Temer chamou a matança de “acidente”. Criticado pelo posicionamento, ele reafirmou a opinião, publicando no Twitter sinônimos da palavra.
Na semana passada, o presidente admitiu “angústia” com as condições “desumanas” nas cadeias do país, e defendeu que a União aumente a participação na questão, por se tratar de questão de segurança nacional. Mesmo reconhecendo a precariedade no sistema carcerário, Temer defendeu o governo, argumentando que a ex-presidente Dilma Rousseff, ex-companheira de Presidência por mais de cinco anos, havia investido menos no Fundo Penitenciário Nacional (Funpen).